UMA LÁGRIMA COLORIDA

O garoto chegou próximo à janela e ficou a olhar o movimento da rua. Morava numa cidade pequena, destas de interior, onde as ruas são estreitas, os carros são poucos e as pessoas costumam desempenhar as suas atividades utilizando muito mais as bicicletas do que os veículos automotores.

A chuva caía forte lá fora, e as pessoas passavam apressadas para o trabalho, com os seus guarda-chuvas a lhes proteger o rosto e apenas metade do corpo. Agora passava o Seu Joaquim, da farmácia. Ele e os dois filhos. Estava indo deixar os meninos na escola. Os garotos usavam uma capa de chuva azul e vermelha, com uma enorme estampa do homem-aranha nas costas. O menino, que a tudo assistia da janela, sentiu vontade de ter uma capa daquelas.

Acordara cedo devido ao frio intenso daquela manhã. A mãe já havia saído para o trabalho e só voltaria à noite. A irmã mais velha tomava conta dele e de mais dois irmãos menores. Os seus dias eram sempre semelhantes. Os dois caçulas iam para a aula, a irmã mais velha quase não saia da cozinha e ele ficava na janela, fazendo aquele mesmo exercício de contar os poucos carros da cidade, ou mesmo, admirar algo bonito que as crianças de sua idade viessem a ter.

Naquele dia, estava um pouco diferente por causa da chuva que molhava toda a cidade e enchia de tristeza o coração do menino. A cidade parecia mais escura, as pessoas mais apressadas, e o menino não encontrava outra opção para fazer passar o tempo. Então, permanecia no mesmo local. Da janela, já contara a passagem de dois carros e perdera a conta de quantas bicicletas haviam passado por ali.

Até que mais um carro passou em frente à casa do menino. Era o carro do prefeito. Os filhos dele estudavam na cidade vizinha, numa escola bem melhor que a sua, daquelas que somente os filhos dos ricos podem estudar. O motorista ia deixá-los agora. Os filhos do prefeito tinham ainda muitos brinquedos bonitos. Brinquedos que não se vendiam por ali e só se costumavam ver na televisão.

Um grito que veio da cozinha despertou o menino de suas cogitações. Era a irmã que o chamava para tomar o café. O garoto caminhou até a cozinha e sentou-se próximo à mesa. Uma xícara de café com duas bolachas. Todos os dias eles comiam aquelas bolachas da padaria do Senhor Gomes. Bolachas sem gosto, sem sal. Talvez por isso custassem tão pouco.

Ai o menino lembrou da Lanchonete que ficava por trás da praça. A lanchonete que possuía um nome estranho e um letreiro iluminado que tanto lhe chamava a atenção. Lembrou-se ainda dos pãezinhos e dos biscoitos que serviam lá e todos diziam serem gostosos. Nas tardes de domingo, após a missa, os pais costumavam levar seus filhos lá, para tomarem sorvetes. E ele sentia sempre uma enorme vontade de poder participar destes momentos. Mas o dinheiro que a sua mãe ganhava não lhes permitia isto.

Após o café, a irmã lhe ordenou que fizesse logo o dever de casa, pois a professora havia reclamado à mãe sobre o exercício em branco que ele às vezes levava.

Terminado o exercício, o garoto retornou à sua janela. A chuva permanecia. Mas o movimento da rua estava mais calmo. As águas se acumulavam próximo da calçada e desciam para o lado mais baixo da cidade, ocasionando uma leve correnteza.

Depois de alguns minutos, a chuva foi ficando fininha e aos poucos passando. O garoto olhou o céu, ao longe, e percebeu um enorme arco colorido que se formava. Um bonito espetáculo da natureza! Mas nem isto foi suficiente para alegrar o coração do menino triste. Sem ele mesmo perceber ou mesmo entender, seus olhos ficaram pesados de repente.

E na pele macia do seu rosto, caiu uma lágrima, que chegou a refletir o mesmo arco-íris que há pouco o menino admirara.

Autor: Ranovi Vieira

Nonato Costa
Enviado por Nonato Costa em 10/03/2007
Código do texto: T407751