A VIDA PASSA NUM FAROL

Camisa de manga comprida desgastada pelo uso excessivo, calça jeans desbotada, sapatos gastos e um boné que tenta diminuir o efeito castigador do sol. Caixa de isopor pendurada no pescoço, braços e mãos ocupadas com mercadorias que são vendidas no semáforo. Um sorriso aqui, um cumprimento ali e uma venda acolá. É desse jeito que o pernambucano Clemir Torres Barbosa, 56, consegue seu sustento na capital paulista. Barba branca da mesma cor dos cabelos, pele queimada do sol e ao mesmo tempo castigada pelo frio de um clima descontrolado desses últimos anos. O efeito do tempo mais o carinho dos clientes lhe deram um apelido que o deixa muito satisfeito: “O Velho do Farol”.

O dia ainda nem clareou e lá vai ele buscar mercadorias no centro da cidade, logo mais, próximo das 10h, dá continuidade em seu trabalho, mas dessa vez é no semáforo. Com chuva ou sol, ansiosamente aguarda a fase vermelha para que as vendas surjam repentinamente. O que é considerado problema para motoristas e governantes, para o pernambucano, o trânsito é um motivo a mais para ser feliz e as filas intermináveis de automóveis significa dinheiro no bolso e barriga cheia. A grama morta do canteiro central da avenida deixa pistas de que ele caminha boa parte do dia no mesmo local. O verde, o amarelo e o vermelho do semáforo controlam a vida desse vendedor.

Suas mercadorias não têm um valor tabelado: “aqui é de acordo com a cara do caboclo. Se parecer que tem dinheiro o preço sobe sem dó”. Um produto que geralmente é vendido a dez reais, no carro ao lado, pode valer vinte e cinco. Essa diferença de público é o que faz o tão conhecido Velho do Farol deixar a zona leste da capital paulista onde mora com a esposa, três filhos e sete netos, para vir ao “seu” semáforo” na zona oeste. O motorista João Carlos ainda um pouco distante grita: “Ei Veio! Tem capa para volante?” Com os olhos brilhando a resposta vem de imediato: - Tem sim. E pra você o valor é R$ 15,00. O semáforo abre, o dinheiro entra e os dois ficam satisfeitos.

Por volta das 20h o trânsito começa a diminuir e juntamente com ele diminuem as vendas, aos poucos vai guardando tudo o que não foi vendido: uma capa para celular, um boneco do Patati Patatá e um fardo de água mineral. Entretanto, descansar nem passa pelo pensamento do Sr. Clemir. Após esse horário, o Velho do Farol trabalha de vigia noturno em um posto de combustível, ali mesmo no entroncamento das avenidas: Jaguaré, Corifeu de Azevedo Marques e Escola Politécnica.

Para casa, só vai aos sábados e domingos, isso porque depende dos R$ 600,00, que recebe por mês para cuidar da segurança do posto. Parte desse dinheiro entra sistematicamente em uma conta poupança, pois a saudade da terra natal e a vontade de construir uma vida mais tranquila lhes dão forças para abdicar de alguns “luxos”. As horas passam e os dias também e os deveres de pai não deixam o cansaço vencer o corpo. Com as forças renovadas e com inúmeros sonhos na bagagem, lá se vai o Velho do Farol, transformando os desafios do dia a dia em vitoriosas superações.

Eder Tofanelli
Enviado por Eder Tofanelli em 08/01/2013
Código do texto: T4073469
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