E o fim do mundo?

     
1. Catarina, minha netinha, nove anos, chegou, e, sorrindo, me disse ao pé do ouvido: "Vô, deixei de ser boba." E eu, que sabia que boba ela nunca fora, perguntei-lhe, sem hesitar: agora me diga por quê. E ela: "Deixei de acreditar nessa história de que o mundo vai acabar. Vô, dezembro passou, e o mundo não acabou". 
     
2. É que ela ouvira de suas amiguinhas e de alguns adultos medrosos que um tal de um calendário dava como certo o fim do mundo em dezembro de 2012. 
     
3. Aproveitei para lhe fazer um sucinto relato sobre "profetas" e "profecias" que, vez em quando, aparecem por aí anunciando o fim do mundo. E até marcando o dia e a hora em que a Terra (o mundo?) deve desaparecer para sempre do rol dos planetas conhecidos. 
     
4. Fiz-lhe ver que houve um tempo em que eu também chegeui a acreditar no fim do mundo. Imaginava que a destruição da Terra podia vir no rabo de um cometa ou no coriscar de um raio malandro, em dia de tempestade braba. E ela escutando. 
     
5. Disse-lhe  do susto que tomei quando, pela primeira vez, vi riscar no horizonte uma estrela cadente. Que quase apanhara do meu pai pelo escândalo que dei, olhando, apavorado, para o céu escuro do Iguatu, no sertão do Ceará, enquato a cadente desaparecia no horizonte. 
     
6. Não existiam os para-raios. Pouco ou quase nada se sabia do que acontecia na imensidão do espaço sideral, ainda sem satélites, com suas poderosas lentes fotografando tudo lá por cima! 
     
7. Minha neta ouviu tudo, e novamente sorriu. Li nos seus olhinhos o desejo de um mundo melhor, bem melhor do que este que estamos, ela e eu, atravessando... 
     
8. Muito bem. A primeira pessoa que me falou sobre o fim do mundo foi o meu velho e ranzinza vigário, idos de 1940. Eu mal houvera saído dos cuidados das dedicadas catequistas da minha paróquia. 
     
9. Ao contrário de Santo Agostinho, que mandava odiar o pecado e amar o pecador, o velho cura, breviário na mão, ojerizava as duas coisas ao mesmo tempo. E, então, ameaçava o desesperado do pecador com o rigor do "juízo final", no final dos tempos, que podia acontecer a qualquer momento. Um terror! 
     
10. Cronista, alimentando-me, portanto, dos "fatos do cotidiano", não quero deixar de escrever alguma coisa sobre a notícia que apavorou os incautos, no final de 2012, ou seja,  de que o mundo ia acabar, antes de 2013, de acordo com o calendário dos maias. 
     
11. O boato - chamo-o de boato - deixou muita gente em pânico, e não podia ser difetente. Houve, me disseram, quem se despedisse dos parentes e  dos amigos; e até dos cachorrinhos de estimação, bebendo homéricos pifões.  Outros preferiram fazer suas despedidas prostrados ao pé dos altares ou dos confessionários. Nada, porém, se confirmou. Veio o Rèveillon, e tudo acabou numa taça de champanhe. 
     
12. A uma beata angustiada que me procurou, terço nas mãos, para saber se o "Juízo Universal" estava mesmo certo para acontecer no dia 21 de dezembro de 2012, aumentei a sua aflição, repetindo-lhe uma estorinha que Machado de Assim (1839-1908) nos deixou. 
     
13. Conta o Bruxo, que, nas alagoas, um frade, de indiscutíveis virtudes, vivia a benzer velas e fósforos dos seus fieis, que se declaravam com medo do "fim do mundo". Questionado sobre esse seu estranho comportamento, o frade respondia: "Eu não sei. Mas a Deus nada é impossível." 
          Ela persignou-se umas três vezes, e se mandou...  

          Nota - Na foto, Catarina Jucá, minha neta, com o seu alegre sorriso. 
               

Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 06/01/2013
Reeditado em 18/09/2019
Código do texto: T4070824
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