Música e Literatura

É verdade que nunca fui muito normal. Sempre fui – e continuo sendo – meio esquisitinha. 2012 está sendo bem complicado emocionalmente para mim, cheio de altos e baixos. Muitas dúvidas, incertezas, problemas cujas soluções não dependem mais de mim.

Tenho buscado o ponto de equilíbrio. Não é um caminho fácil e nem sempre consigo. Procuro fazer coisas que me são prazerosas – pequenas doses de felicidade em meio ao temporal. Uma boa atividade é a leitura, mas não qualquer leitura... Não leio livro de auto-ajuda, por exemplo. Este tipo de livro me provoca efeito contrário, é deprimente.

Leio literatura pura. Ultimamente tem sido: José Saramago, Eduardo Galeano, Gabriel García Marquez... Uma biografia da Frida Khalo. A coluna da Eliane Brum toda segunda-feira e a do Ivan Martins toda quarta. Também o blog de uma jornalista de Florianópolis chamada Elaine Tavares que descobri há pouco tempo. E as tiradas da Adriane Canan, outra jornalista da Ilha de Santa Catarina, que tem feito muita literatura de qualidade via facebook.

Música também não pode faltar. Tem poder transformador. Faz tempo que queria voltar a cantar. Hoje retornei a um grupo de cantoria que integrei há uns seis anos. Assim como a literatura, o canto liberta, coloca no eixo, alinha o corpo, a alma, a mente e o coração. Cantar faz serenar.

Saí do encontro sentindo que voltar a cantar foi uma escolha muito acertada e feliz. Vinha pensando nisso no caminho de volta. De repente tudo se transformou quando olhei para um homem no calçadão da Felipe Schmidt, uma das principais ruas do centro de Florianópolis. Era um homem de pele clara, muito magro, estatura mediana, cabelos pretos e curtos, usava uma camisa de botão e mangas curtas de cor verde clara, a calça puída de sarja cinza deixava à mostra um pedaço da canela, meias e sapatos sociais pretos gastos e desengraxados, no rosto uns óculos grandes de metal, estilo aviador, lentes de grau – parecia que se escondia atrás daqueles óculos. Caminhava com a cabeça baixa e os olhos voltados para cima. Fumava segurando o cigarro com o polegar e o indicador, parecia que trazia a cabeça repleta de pensamentos confusos. Levei um susto! Reconheci na hora: Era o Abel, personagem do livro “Claraboia” do Saramago, minha leitura atual, tal qual a imagem que criei na mente. Sorri. E saí rindo sozinha.

Daí em diante olhava para as pessoas na rua e ficava imaginando: esta bem que poderia ser personagem de algum livro do Gabriel García Marquez, aquele parece mais saído de um livro da Isabel Allende, aquela moça ali também tem cara de Saramago... Era inevitável, eu não conseguia controlar... E para aquelas pessoas que não conseguia relacionar a nenhum autor eu inventava-lhes histórias.

Por um momento achei que estava ficando louca, aquilo nunca havia me acontecido antes. Vez por outra até tentei imaginar a história de algumas pessoas, principalmente quando eu andava de metrô em São Paulo – a diversidade do metrô é inebriante, ainda mais para quem sempre viveu numa cidade sem metrô –, mas nunca tinha sido assim de forma tão intensa. Quem sabe eu não esteja me transformando em escritora de verdade?

Lembrei-me do filme “Meia Noite em Paris”, do Wood Allen, cujo personagem principal, um escritor e roteirista americano chamado Gil, numa viagem a Paris encontra e conversa, todas as noites, com grandes escritores e intelectuais, todos já falecidos. Como se viajasse no tempo toda noite, no mesmo horário (meia noite), e assim ele questiona a própria vida, os próprios caminhos...

É bom quando encontro alguém com um pensamento que parece mais louco que o meu! Não, eu não estou ficando louca! Não sei onde esse devaneio vai parar e nem mesmo se vai me levar a algum lugar... Mas sinto como se alguma coisa tivesse sido ligada dentro de mim... Acredito que a música tenha me despertado, afinal de contas, “quem canta seus males espanta”.