A GREVE DE FOME MAIS CURTA DA HISTÓRIA

Trancou-se no quarto. Resolveu que ia fazer greve de fome. Estava indignado porque a mãe o proibira de acessar a internet, já que o rendimento escolar estava abaixo do esperado. Não compreendia como ela pudera ter cometido ato tão tirânico.

- É uma mulher sem coração. A extensão de Adolf Hitler – resmungava.

- Pare com já com essa bobagem de greve de fome, Regino. Saia já desse quarto e venha comer, menino – dizia a mãe preocupada – você já esta aí há horas. Nem sequer almoçou.

- Ficarei sem internet, mas, também, desnutrido - esbravejava.

Indignado, começou a bolar planos mirabolantes. Decidiu que iria partir mundo afora, afinal, tudo que precisava estava ali, em seu quarto. Era só pegar umas quatro peças de roupa, o violão, para tocar clássicos do rock e autorais nas calçadas das cidades e ganhar algum dinheiro, a escova de dente azul de cerdas macias, para quando a greve de fome acabasse, preservativos – nunca se sabe quando pode aparecer uma groupie – e um broche do Che-Guevara preso na mochila, além, claro, de livros, já que ficaria sem poder acessar o Google. Estava decidido. Ia ser a voz das minorias, o mártir dos filhos que são proibidos pelas mães de se conectarem a internet.

Em todos os cantos desse planeta, saberão da minha existência. E meu nome será mencionado nos livros de história – dizia pomposamente com a cabeça erguida. Internet ou mor...

- Cala essa boca e vem logo comer, moleque! Não vou falar duas vezes, hein!

- Pô, manhê...

- Vou te dar cinco segundos, Regino! Tu estás ouvindo? 1... 2... 3... 4...

- Nheeeeeeeennc.

- Tá, tá! Já tô saindo... Velha chata – sussurrava.

Frustrado, sentou-se cabisbaixo à mesa. Em seguida, a mãe serviu uma vistosa lasanha de frango, com azeitonas pretas e um queijo provocantemente elástico.

Tentou resistir, mas o cheiro estava ótimo. Contrariado, deu a primeira garfada. Não resistiu. Estava formidável. Mastigava freneticamente.

Comeu como quem acabara de sair da cadeia. E toda a ideologia que havia construído minutos antes estava se esvaindo, diante daquela suculenta porção de lasanha. Só foi cair em si quando já estava saciado. Havia perdido a guerra. Mas o garoto tinha juízo. Afinal, até o mais nefasto dos bandidos e o mais audaz revolucionário teriam sanidade mental para não ousar desafiar a própria mãe. Estava, então, encerrada a greve de fome mais curta da história. Vencido pela comidinha da mamãe.