Simpatias de final de ano
Para aquele homem apenas mais um ano estava por iniciar-se. Hora de renovar as promessas não cumpridas, refazer pedidos não concretizados e esperar, esperar que o novo ano lhe trouxesse sorte no amor, dinheiro e muita felicidade. Todo ano a mesma coisa: escolher entre pular as sete ondas, comer as sete uvas, comer lentilha na ceia, comer romã, vestir-se de branco se desejar mais paz do que dinheiro ou vestir de amarelo se desejar mais dinheiro do que paz. O homem nunca conseguiu decidir-se nesta questão, por isso sempre optou em mesclar, um pouco de amarelo para o dinheiro e um pouco de branco para a paz. Quanto às simpatias a única a seu alcance era mesmo pular as sete ondas, pois esta não tinha custo, as demais sempre lhe custaram os olhos da cara.
Até então o homem não sabia que a virada do ano poderia não acontecer, o novo ano estava ameaçado por uma profecia de que tudo poderia acabar antes mesmo do natal. Seria o fim do mundo.
Já tinha tudo programado, já sabia que as promessas seriam as mesmas do ano anterior, não conseguiu cumprir nem mesmo a de iniciar a velha dieta. Os pedidos também seriam os mesmos, pois nenhum deles fora atendido até a presente data, certa vez chegou a pensar em trocá-los, mas iria tentar mais uma vez. O negócio era repetir o ritual: pular as sete ondas, fazer sete promessas, fazer sete pedidos e sete desejos. Estava indeciso quanto às cores: branco traria paz, mas estava convencido de que não haveria paz sem dinheiro, amarela traria dinheiro, mas muito dinheiro lhe tiraria qualquer possibilidade de ter paz. Por isso nos anos anteriores optou-se também por mesclar. Mas este ano estava pensando numa pequena mudança, afinal, anos se passaram e nada acontecia de novo, a não ser as alterações do calendário. Ele só não imaginava que estava prestes a alterar toda sua programação por causa de um boato de que o mundo iria acabar naquela semana. Decidiu-se pelo amarelo, adiou seu pedido de paz. Vai que desta vez seria atendido pelo menos em um dos seus sete desejos!
Foi no meio de sua programação que ficou sabendo da tal profecia. Homem de muita fé que era, (se é que poderia ser visto assim), foi logo acreditando no dito. Pobre não tem sorte mesmo, não tinha mais nenhuma dúvida que se fosse o fim do mundo seu desejo de ficar rico no próximo ano seria realizado. Desolado, voltou-se para sua programação. Agora para esperar o final dos tempos. Sempre acreditou que este dia estava por vir, não era novidade, mas sentiu-se traído pelo tempo, afinal este não lhe dera oportunidade de ter um amor, uma vida farta e nem a sonhada tranquilidade. Mas estava escrito, chega a hora e pronto. Era preparar-se para o fim. Pegou suas economias comprou um bonito terno branco com uma gravata amarela, não precisaria mais de muito dinheiro, comprou lentilha, romã e muitas uvas para a ceia de cerimônia de fim do mundo. Tudo pronto. Sem pedidos, sem promessas, sem esperanças e sem economias, apenas um desejo, que pelo menos no fim do mundo um dos seus desejos fosse atendido e tudo ocorresse em paz! Vestido a caráter, sozinho, fez a ceia, depois seguiu para o mar, não pularia as sete ondas, não havia necessidade, uma resolveria seu caso. Subiu na mais alta das rochas da beira da praia para esperar uma boa onda, afinal essa se resumiria em todas as outras. Ao avistar a grande onda, preparou-se e se atirou de braços abertos ao seu encontro gritando: “Não precisa ser muito dinheiro!”
Nunca mais este homem foi visto nas redondezas. A profecia não se cumpriu. A única coisa que se tem certeza é que muitos seguem acreditando em simpatias de ano novo e profecias, no entanto, não conseguem acreditar em si mesmos.