A CAMINHO DO SEMINÁRIO

O texto a seguir foi extraído de “Crônicas da Vida Inteira”, livro inédito sobre fatos da minha vida, adaptado para o Recanto das Letras.

A CAMINHO DO SEMINÁRIO

Assim, os primeiros albores do dia 23 de janeiro de l952 nos surpreenderam, a mim e a mamãe, à beira da estrada, à espera do ônibus dos seminaristas que passaria bem cedo rumo a Rio Negrinho, no norte de Santa Catarina, onde ficava o Seminário São José, da Congregação dos Padres do Sagrado Coração de Jesus.

Eu tinha então treze anos. Ave ainda implume a ensaiar os primeiros voos, eu deixava o ninho quente e acolhedor e me aventurava pelo mundo. No lusco-fusco do amanhecer eu via lágrimas nos olhos da mamãe, lágrimas silenciosas, mas confiantes, pois sabia a quem estava entregando o filho.

Quando o ônibus buzinou longe, ela me estreitou nos braços, cobrindo-me de beijos, e eu percebi que seus lábios trêmulos se emudeceram na dor da separação sem poder dar os últimos conselhos que só as mães sabem dar.

Desceu apenas o Padre Vendelino Viemes, que comandava o arrebanhamento, cumprimentou-nos rapidamente, ajeitou minhas malas no bagageiro, e instantes depois eu partia, deixando mamãe ali sozinha com sua dor e suas lágrimas, as mesmas que ainda me banhavam o rosto.

O ônibus estava cheio de meninos e rapazes, todos seminaristas com o mesmo desejo e igual destino. A algazarra era grande. Todos demonstravam a maior alegria, uns cantavam outros riam. E lá fui eu sem ao menos pensar na saudade que haveria de vir, tentando, como tantos outros, talvez, esconder o medo, a incerteza, a dor da separação.

O ônibus era um “gostosão” do Expresso Andorinha, de Jaraguá do Sul, contratado pelos padres pra arrebanhar os seminaristas da região. Gostosão era o nome dado aos primeiros ônibus de frente plana por ter o motor dentro da carroceria, como os de hoje, e não sob aquele capô dianteiro como os antigos.

Na Praia Redonda, como era chamada a cidade São Martinho de hoje, embarcaram mais alguns, em São Luís mais outros. Quando o ônibus se deparou com a curva do anzol, no morro da Ponta Grossa, antes de Imaruí, engasgou, tossiu e empacou. Só ia pra trás. Tivemos que descer todos, às pressas, e empurrá-lo morro acima. Nem sei a que horas chegamos a Florianópolis, onde almoçamos, com uma fome danada. Essa foi a primeira vez que estive na capital barriga-verde. Até me emocionei quando o ônibus atravessava o estreito de mar, na direção da ilha, resfolegando já cansado sobre a velha ponte Hercílio Luz.

Já era noite escura quando descemos em frente ao seminário de Brusque, onde pernoitamos. Fomos acordados cedinho. Ainda era escuro. Assistimos à missa, rezada pelo Padre Vendelino, engolimos nosso desjejum e partimos.