Perfume de ácaros

Eu sei que Vinícius de Moraes foi o pai da idéia, mas como aconteceu comigo eu não posso deixar de plagiar: O livro é o meu cachorro encapado (ou teria dito algo bem perto disto)

Grandes idiotas decoraram suas salas com belíssimas estantes para livros, assim como “sábias” faxineiras desocuparam lugares desovando livros. Eu cheguei a tempo, a pilha de livros a ser doada era imensa, e montada por edições que deveriam ter sido abertas na faculdade, e não hoje que já desisti da profissão para a qual eu comprei aqueles exemplares.

Um pouco de nostalgia, muito de ácaros faziam brotar em mim...coriza e eu espirrava muito, o que, naturalmente fazia com que descessem as lágrimas também. Estava me sentindo cúmplice, ou usando de eufemismos, me sentindo conivente com a ação da faxineira, desfazia-me dos livros sem nenhuma sensação de amargor ou arrependimento.

Sempre achei a ironia a arma dos fortes e a vida é forte; ironicamente o livro que eu abri trazia uma mensagem, de quase trinta anos, nunca antes explorada:

“Meu amor, somos da mesma classe, mas parece que montamos futuros apartados, você quase que não me vê. Após ler esta mensagem nos comunicaremos com olhares, quando seu olhar cruzar com o meu...eu acenarei com um “sou eu”, num piscar mais terno.

Se eu olhei para ela, desconhecendo a mensagem, espero que ela não tenha piscado em retribuição, pois estaria aceitando a escuridão, para o resto dos seus dias, em apaixonado ato de Eutanásia da luz.

Tudo aquilo me pareceu um romance já escrito, e até transformado em filme, senti-me Al Pacino em Perfume de Mulher, Apaixonei-me imediatamente por uma imagem borrada, misturando os rostos de 17 colegas de classe.

Vencido pela absoluta falta de recursos para identificar a remetente, sinto-me impotente para agradecer tão carinhosa forma de ilustrar meu livro; para retribuir tão fiel carinho. E, agora, me flagelo, por não ter sido mais estudioso