Dois irmãos da rua
Se uma voz me narrasse o instante que me fez escrever esta crônica, talvez o encanto dele eu não sentiria. Talvez as narrações de nossas retinas sejam mesmo mais impactantes...
Eram dois e, na verdade, são milhares. Dois seres, duas ilhas, dois errantes. Eu estava no carro - no banco de trás. Naquela época, tinha eu meus doze anos. Era uma rua pequena, o que possibilitou a total apreciação daquele instante que, facilmente, renderia um filme.
Nenhum dos dois têm o nome conhecido. Porém, chamo um de "Cachorro" e, o outro, de "Menino". Caminhavam na rua e de repente se encontraram, de repente se olharam, de repente se depararam, de repente se amaram. Ficaram imotos durante todo o tempo em que eu pude observá-los profundamente.
Ali, amigos, houve talvez o encontro de duas vagas vidas. Ali, amigos, houve talvez - além da troca de olhares - a troca de desabafos. Ali, amigos, Menino e Cachorro se depararam com a grande diferença anatômica que os separavam e, ternamente, espantaram-se com a grande semelhança incondicional que os unia na figura de irmãos da rua.
Não vi - infelizmente - o desfecho daquele instante. O fim não é o mais importante quando o meio já é capaz da comoção às lágrimas e às faces. Por isso, aquele encontro não consumado em minhas retinas se cristalizou em minhas lembranças.
Há encanto, amigos, no Sol, na Lua, na Rua e nas esquinas... E os extremos se amam e se confortam, é necessário apenas uma semelhança incondicional: o amor solidário.
27/12/2012