Minha história de leitora
Desde criança, tive o fascínio pela escrita, ficava olhando a minha mãe fazer listas de compras e a achava “poderosa” listando ali o que gostaria de comprar, aquilo me passava uma ideia de que quem soubesse escrever, poderia escolher o que comprar e anotar no papel para depois ir “buscar” no mercado. A minha primeira experiência com a leitura se deu exatamente assim, observando a minha mãe.
Eu vivia pedindo que ela trouxesse coisas do mercado e às vezes ela não trazia tudo o que eu queria, então eu ficava observando cada letra que ela colocava no papel para tentar descobrir se era o que eu pedira. Ainda estava aprendendo a ler e um dia, após um enorme esforço li: “paaaapeeeeeel hiiiiigieeeeeêniico...PAPEL HIGIÊNICO”!__ Dei um grito de alegria por ter lido, mas fiquei furiosa porque não era aquilo que eu queria, minha mãe ficou feliz pelo ocorrido , começou a falar pra todo mundo que eu estava lendo. Muita gente gozou de mim por causa da minha primeira leitura e pela forma como ocorreu, até hoje há quem se lembre disso.
No entanto, a sensação de poder ficou marcante pra mim naquele momento, e só hoje percebo com clareza o que descobri "a partir de agora, ninguém me passa para trás”. Adquiri segurança. A leitura passou a fluir e eu comecei a me interessar cada vez mais. Tenho a impressão de que este foi um encontro racional, cognitivo com a leitura, o momento passional veio depois.
Quando eu estava na quinta série, hoje chamado sexto ano do ensino fundamental, tive uma professora de língua portuguesa encantadora. Ela iniciou um trabalho de leitura com o livro Angélica, de Lygia Bojunga. A leitura se dava de forma tão prazerosa, que me apaixonei pela história, pelo livro, pela autora. Era a primeira vez que me sentia leitora de verdade. “Estou lendo um livro", dizia empolgada. Não esqueço desse livro, até hoje lembro da história e sempre comento sobre ele quando meus alunos me perguntam como consigo gostar de leitura. Me encanta saber que consegui “reproduzir “ em muitos alunos meus o que acontecera comigo. Muitos odiavam leitura e hoje trocam livros comigo. Isso é gratificante demais.
Depois de descobrir a paixão pela leitura não parei mais, atormentava meus pais para comprarem livros pra mim. A minha primeira coleção foi O Sítio do Pica-pau amarelo. Eram livros pequenos, de capa dura. Eu fiquei muito feliz quando abri a caixinha e vi os meus livrinhos. Adorava ficar às tardes lendo.
Hoje, analisando essa trajetória tenho a impressão de que não fui apresentada à leitura, ela se apresentou a mim. Aproveitou-se daquela listinha de compras que minha mãe costumava fazer, para entrar na minha vida devagar e depois em forma de “anjo-cegonha” veio me mostrar angelicalmente que na nossa vida, podemos fazer escolhas e precisamos lutar por elas.