A TORRE DE BABEL

Escrita em 08/05/2010

Faço, aqui, uma homenagem a meu pai, que teria, se vivo fosse, 100 anos de idade. E, extensiva aos outros dois ilustres cidadãos, pais de grandes amigos meus.

Na realidade, eles são a personificação da Torre de Babel. Um brasileiro, um árabe e um japonês. Mas, diferente da Torre, e apesar dos sotaques, os três falavam a mesma língua. Gostavam de uma boa cachaça!

Acredito que o mais velho dos três seria o representante do país do sol nascente, vindo ao Brasil, salvo engano, se não no primeiro navio, o Kasato Maru, logo depois dele. Sei que, sempre me pareceu um personagem de alta estirpe, aliando o respeito que demonstram os nipônicos, à constante elegância no trajar, e à seriedade de seus modos. Realmente, um líder de sua colônia. Foi o representante da família Assunção, na comercialização do loteamento que deu o nome ao bairro de mesmo nome, em Santo André, como também, do Parque Erasmo Assunção, na mesma cidade. Recebeu o título de cidadão honorário deste Município, por ocasião da comemoração do cinquentenário da imigração japonesa, em 1958. Foi um líder nesse festejo. Inolvidável a festa dos 50 anos, realizada num paraíso que existiu na Fazenda da Juta, onde havia um templo japonês, e diversos outros monumentos característicos do Japão. Suyemaro Okumura.

O árabe era a alegria em pessoa. Brincalhão, conhecido por todo mundo em Santo André, como “Titio”, também sempre elegante, se destacava dos demais, pela estatura alta. Seu porte impunha respeito. Porém, isso não impedia ter ele um tratamento diferenciado de todos os conhecidos, sempre sorrindo e brincando, principalmente com crianças. Um ótimo homem, o “seu” Said Chedid. Um ótimo amigo! Atacava de corretor de imóveis, frequentando uma sala do Edifício Tibiriçá, na rua Campos Sales, onde se reuniam os três.

Antonio Lima. Bernardense, de família tradicional, veio para Santo André ainda menino, onde trabalhou na Estação Ferroviária e, posteriormente, na Prefeitura, até se aposentar em 1957. Na Municipalidade, de início lançador de tributos, percorria o município em uma charrete. Devido à sua função, ganhou muitas amizades, principalmente, daqueles que lidavam com imóveis, como foi o caso de seus amigos já comentados. Aos poucos, ganhou algumas promoções, chegando a tesoureiro, aposentando-se nesse cargo.

Os três eram inseparáveis. Como já falei, gostavam mesmo de uma branquinha. Conheciam diversos alambiques, como em Ribeirão Pires, no lugar chamado Quarta Divisão; em Santo Amaro, Parelheiros, de um caboclo chamado Nhô Amaro. Quando iam nesses lugares, voltavam com o automóvel repleto de garrafões. Outra distração dos amigos era comer.

Tinham um refinado gosto, frequentando somente bons restaurantes da região e de São Paulo. Eu aproveitava essas ocasiões, aos sábados, quando eles iam me pegar no colégio. Íamos aos mais variados lugares. Em São Paulo, no Almanara, o primeiro da cadeia, na antiga rua Santo André, hoje Abdo Schain, perto do Mercadão, ou no Guanabara, na região bancária da Capital. Em São Bernardo do Campo, no saudoso Binder, cujo camarão à grega até hoje não tem igual; na Cantina do Chico no Rudge, ele já idoso, sempre com o chapéu de cozinheiro e avental alvíssimos, nos oferecendo a especialidade do dia, como o cabrito, a rã, o coniglio, os pescados, tudo um manjar dos deuses. Aqui em Santo André, não havia muitas opções. O Suíço, na Vila Pires, o Anchieta, no centro eram os mais requisitados.

A amizade dos três era muito forte, demonstrada inúmeras vezes. Certa ocasião, se não me engano, perto do dia 29/06 de determinado ano, haveria um sorteio especial pela Loteria Federal, comemorativo ao dia de São Pedro. Um dos três não estava na cidade, e meu pai e o outro, como sempre, compraram o bilhete. Ganharam a aproximação do primeiro prêmio, que não era uma fortuna, mas uma boa bolada. O dinheiro foi dividido entre os três.

Para felicidade deles, o Hiroshi, o Farid e eu, seus filhos, somos grandes amigos. Frequentamos a mesma roda de amizade, tomamos nossos aperitivos (menos o Hiroshi), principalmente aos sábados, quando almoçamos no Panelinha e, volta e meia, nos vem à memória, a figura daquele trio tão saudoso, que cultivava uma amizade sincera, como um exemplo vivo e constante, que deve ser sempre relembrado e exaltado.

Nossas homenagens a vocês, queridos pais. De onde estiverem, rogamos as suas bênçãos!

Aristeu Fatal
Enviado por Aristeu Fatal em 26/12/2012
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