NATAL EM PARIS

O sol, como por encanto, tímido a princípio, porém radiante logo depois, como por encanto ou capricho da natureza, resolveu aparecer hoje, penso que por ser uma data especial para nós cristãos, o dia do Natal, e veio ele exibir, soberbo, o seu incomparável brilho sobre a cidade de Paris. Quiçá, por razões festivas, tenha vindo saudar o espírito natalino com o calor de seus raios e abrir seu imenso sorriso para amenizar esse friozinho que paira sobre nós e se espalha pelas ruas fervilhantes por onde passo. Há um harmonioso clima de purificação de almas, de brancura de corações, de espiritualidade aberta, de incomparável sublimação se fixando nas praças, nas esquinas, nos olhares, nas palavras que são pronunciadas entre as pessoas. Os sorrisos como que gritam altissonantes a anunciar algo imponderável, parecem querer se referir a qualquer fascínio explicável tão-somente pela beleza da ternura, prenunciando novos horizontes, plantando sementes de paz, cultivando a plantinha doce da fraternidade.

Os atrasados, e são muitos, inúmeros decerto, acorrem às lojas para escolher e adquirir os presentes, aos supermercados com vistas às últimas compras dos alimentos necessários à ceia natalina, a hora exige pressa. Por essa razão acotovelam-se, a passos rápidos vão de uma gôndola a outra, apalpam, cheiram, leem as informações das embalagens, súbito ouço gargalhadas jovens alhures, brincam com o barulho, riem em alto e bom som, já as vozes maduras desmanchando-se em experiência, soam moderadas e calmas, lá adiante são as crianças que se atrevem a dar palpites sobre as lembranças desejadas de Papai Noel, chegam a chorar ao serem contrariadas, as mais mimadas esperneiam em desespero ensaiado. O burburinho no interior do supermercado ultrapassa os níveis do razoável e o calor humano afasta momentaneamente o poder do frio mordendo as ruas.

Mas é precisamente esse ambiente de compartilhamento e ternura acentuados que se dispõe a dividir espaço com a própria aura da Cidade-Luz, ambos se entrelaçam, amoldam-se, tornam-se um no ar festino já essencialmente perene. A confraternização da vida, do amor e suas emoções, da fraternidade, da harmonia, da compreensão, esses sentimentos todos em nome do Amor maior, se unem regozijantes ao constante ar festivo parisiense, e é como se ambos, num abraço apertado e firme, dançassem etéreas melodias, bailassem em felicidade, voassem à guisa de pássaros enamorados trocando gorjeios e juras de fidelidade mútua para sempre. Pois não é que homens e mulheres, nesse murmúrio de carícias dobradas entre as duas alegrias, a do Natal e a de ser Paris uma grande festa sempre, trocam carinhos amigos, mandam sorrisos entre si, à distância que os separa, pela brisa suspirante, fazem esse dia se transformar num oceano de bons augúrios.

Paris quase anoitece, as luzes das vitrines, das ruas engalanadas e dos prédios pulsando através dos corações humanos, iniciam seu festival efusivo de extasiante luzeiro europeu. E fica ainda mais linda, merecendo o título que lhe dá maior tipicidade, mais glamour, o aspecto de luar radiante. Em pouco, fecharão os estabelecimentos comerciais, as pessoas deixarão as ruas, que se farão quase vazias, e irão para seus lares, alguns também para os restaurantes simples ou luxuosos, de maneira que cada um fará sua comemoração do Natal ao lado dos seus. A ceia da meia-noite nunca se faz de rogada, deveras estará pronta para os comensais, a mesa lindamente arrumada, pratos e talheres dispostos elegantemente, o vinho francês de sabor especial, frutado, a lembrar madeira de florestas virgens e conter em si, também, traços achocolatados, em diversas garrafas para o deleite, por sua, é claro, espera ser destampado com os gestos de quem é habituado a uma bebida de classe.

O Natal em Paris pode não ser diferente do resto do mundo para quem não teve o privilégio de estar em seu solo nessa maravilhosa época, mas é. Por que assim é? Não se explica, apenas se desfruta, e quantos já o experimentaram, é quase certo, tem belas histórias de fantasia para contar. Porque estar em Paris no Natal é simplesmente embarcar num navio mágico e navegar em águas tranquilas, indo para lugar algum, contudo indo, seguindo o curso dos mares, sonhando em devaneio sabendo existir um porto seguro adiante, um lugar qualquer onde esse navio descerá âncoras para explodir em grandiosa confraternização. Todos comem, riem, conversam, se presenteiam e se abraçam, há quem até chore emocionado, simplesmente, pois há momentos, como esse, em que as lágrimas não necessitam de explicação para brotar dos olhos marejados, elas meramente descem face abaixo e se vão para o universo onde se debruçam as emoções sobre as rosas e os lírios.

Vivi esse acontecimento muito terno e indizível, esse mágico e fascinante período de Natal aqui em Paris, sonho por mim há muito acalentado com o carinho de quem espera torná-lo realidade um dia. Derramei-me em copiosas lágrimas abraçado a minha esposa, que por sua vez chorava, os dois afogados na alegria de ver realizado nossos anelos de outrora, de ser parte dos festejos do Natal na cidade mais cobiçada nas utopias dos sonhadores, de viver o mais glorioso de nossos natais tão próximo da Torre Eiffel quanto possível, mirando-a da janela enquanto ela borbulhava em luzes e girava seus dois holofotes sobre a Paris que nos recebeu para festejar conosco o Natal de Jesus.

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 25/12/2012
Reeditado em 06/07/2021
Código do texto: T4052924
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