NOSSO ADEUS À SUÉCIA

Fizemos uma faxina geral no apartamento onde nos hospedamos durante um mês e o deixamos ainda mais arrumado do que quando aqui chegamos. Guardamos nossos pertences e nos empenhamos numa varredura tipo pente fino com a finalidade de não esquecer nenhum objeto nosso, principalmente as pequenas coisas que espalhamos pelos cantos, aqui e ali, algo tão natural aos que permanecem quatro semanas em determinado lugar. Fotografamos os cômodos como forma de lembrança dos dias ali passados, lançamos um último olhar de saudade ao ambiente que nos serviu de lar por trinta dias, colocamos nossa bagagem no corredor, trancamos a pesada porta de aço e descemos os três lances de escadas carregando as malas, nos vimos no térreo e paramos diante das caixas postais referentes aos apartamentos do condomínio.

No silêncio tumular de minha mente um tumulto. Há dias eu vinha pensando nesse preciso momento, ansioso, até mesmo um tanto preocupado, convencido de que quando puséssemos as chaves do apartamento numa daquelas caixas de correspondência não teríamos mais como voltar atrás, e, principalmente, para meu pavor, nem como entrar nele caso necessitássemos. No fundo eu já sabia não ser possível isso acontecer, certamente. Tomaríamos o trem para Copenhague na Estação Triângulo e seguiríamos em frente rumo a nosso novo destino nessa viagem à Europa, não haveria por que retornar. O problema é minha sensibilidade à segurança, gosto do conforto de me sentir seguro quando a possibilidade de um imprevisto é, talvez, viável.

Sem a menor desconfiança do turbilhão de pensamentos temerosos agitando minha alma, Ana calmamente, num gesto simples e rápido, depositou as chaves na abertura da caixa de correspondência relativa ao apartamento onde nos hospedamos, ouvi um estalido que soou terrível aos meus tímpanos, voltei meus olhos para as escadarias tentando acalmar-me, quase enfiei meu braço na abertura mínima por onde as chaves entraram, para pegá-las de volta, contive-me e pensei, aturdido sem entender a razão de tanta emoção negativa: "acabou, agora realmente estamos saindo definitivamente da Suécia, até que Deus nos permita outro passeio pela Escandinávia". Ainda havia mais uma porta pesadona para ser fechada, a do prédio, depois de sairmos. Trancamos essa bendita porta e abraçamos a brisa gelada que nos acariciou os rostos, e nos embrenhamos na noite já cobertos de saudade, nos despedindo de Malmo.

Todas as vezes que eu e Ana entrávamos nalgum trem em viagem para qualquer destino da Escandinávia, eu ficava permanentemente alerta temendo pegar o trem errado na plataforma que não fosse aquela por onde passaria o que nos levaria ao nosso objetivo. Assim aconteceu em nossa ida para Lund, Estocolmo e Copenhague e nos respectivos regressos para Malmo. Certa feita, na viagem de regresso de Estocolmo, por exemplo, para ter certeza de estarmos mesmo no trem que realmente iria para Malmo, perguntei a alguém e ele me assegurou que aquele era, sim, esse mesmo. Ante essa garantia categórica entramos e nos acomodamos num dos vagões. De repente, antes da partida, a própria pessoa que me havia assegurando ser aquele o trem para Malmo me chamou e, espantado, disse-me para descer urgente, depressa, pois ele se enganara. Perplexo, gritei para Ana vir ligeiro, ela sem saber o que estava acontecendo, correu ao meu encontro e quando nos dispúnhamos a sair outro senhor, preocupado, nos mandou parar e voltar aos nossos lugares porque o trem para Malmo era esse mesmo. Em virtude de uma informação duvidosa quase perdemos nossa viagem.

Agora, sob o nevoeiro denso acinzentando Malmo nos nossos derradeiros instantes em terras suecas, caminhávamos a passos largos para a Estação Triângulo no ritmo do adeus, Copenhague nos esperava com vistas à segunda etapa do nosso passeio europeu. Compraríamos as passagens nas máquinas espalhadas pelo local, desceríamos pelo elevador com as bagagens e iríamos procurar qual a plataforma por onde trafegaria o trem que nos levaria para a Dinamarca, o coração em pandarecos, eu trêmulo de emoção e um pouco de medo de nos enganarmos e entrar no trem errado. Todavia, com o cuidado e atenção de sempre, pegamos o transporte ferroviário correto e fomos pela Ponte Oresund no rumo da capital dinamarquesa.

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 22/12/2012
Código do texto: T4049024
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