AINDA TENHO UM SUPER-HERÓI

Quando criança sempre achava meu pai um super-herói. Ele era o mais forte do mundo, o mais bonito, o mais inteligente, o mais mais. Numa pequena discussão com um coleguinha eu já gritava: - Vou chamar o meu pai! Tá bom, eu sei, era mimado. Ficava doido de raiva quando diziam que ele não era forte coisa nenhuma. Ah se dissesse que ele era feio! Um homem experimentado no trabalho e castigado pelo calor do sol. Em suas mãos ainda estão as marcas de um homem simples. O cabo da enxada era o responsável por mãos tão grossas e a peneira numa roça de café, garantia nosso sustento.

A alegria se fazia presente todos os fins de tarde quando ele regressava do trabalho montado em um cavalo branco chamado Sereno, que de sereno mesmo, só possuía o nome. De longe eu o avistava: chapéu panamá, sapatão de couro, garrafão de levar água e camisa pingando suor. Ao seu encontro eu corria em disparada só para voltar para casa montado em seu cavalo, mesmo que fossem somente por alguns passos. O toc toc toc toc dos cascos no chão duro soavam-me como música aos ouvidos. O veião, paizão, paizinho, meu velho e outros nomes que colocava, seguia sempre um mesmo ritual: tomava banho, comia o que tinha na panela e ainda achava um tempinho para me contar suas experiências. Ali com ele, passava alguns momentos, aliás, bons momentos, mas não muitos, porque noutro dia logo cedinho ele começava tudo de novo.

Às vezes me levantava junto com ele, e antes mesmo do galo cantar, a gente cuidava de algumas vaquinhas. Quem nunca foi a um curral de madrugada não sabe o que é leite de verdade. Na roça, as caixas de leite têm chifres e mugem. Pouco depois o velho seguia a caminho do cafezal e eu o observava até que a vista não alcançasse mais. Hoje não moramos mais naquele sítio em uma cidadezinha do interior de São Paulo, por isso tenho que comprar laranja, limão, alface e outras coisas que jamais achei que tivesse que comprar. Bem-vindo à cidade. Só uma coisa me alivia: o jeitão de caipira do meu pai faz-me reviver ótimos momentos. Se pudesse, teria-o para vida toda. E ainda tenho, por isso cuido, homenageio com crônicas e assim tento retribuir pelo menos um pouco do carinho que me deu. Ele não teve estudos e nem fala um português correto, mas as horas que passo com ele são consideradas verdadeiras aulas de pós-graduação da vida. O tempo passou – e rápido – agora não sou mais aquela criança que corria ao seu encontro, tampouco acho que ele é um super-herói, cresci mesmo, e o que era dúvida virou certeza: pai, você é meu super-herói, apesar de não voar.

Eder Tofanelli
Enviado por Eder Tofanelli em 17/12/2012
Reeditado em 17/12/2012
Código do texto: T4040081
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