Uma linda história de amor: Meus avós paternos
Meu avô paterno, Antonio, natural de Trás-os-Montes, em
Portugal. Minha avó, da Catalunha, Espanha. Os dois se conheceram
ainda bem jovens e se apaixonaram. A família do meu avô, abastada,
vivia do comércio, produção rural, imóveis alugados e seguia,
criteriosamente, a moral e o bom costume da tradição rígida, religiosa,
conservadora portuguesa. Meus bisavós, meu avô e seu irmão José
compunham o quadro familiar. Da minha avó, músicos ambulantes;
meu bisavô viúvo, vivia de apresentações mambembes, sem renda
fixa, redator dos próprios espetáculos, ao som de uma guitarra
espanhola, cheia de fitas e cores, sendo a minha avó e sua irmã as
artistas da Troupe. Dizem ter sido um grande poeta, cultíssimo,
vivia sorrindo e não se apertava com nada. Minha vó, Ludovina,
a mais velha, era quem cuidava de tudo.
Numa das apresentações na Praça Principal os dois se
conheceram. Amor à primeira vista. A timidez e inocência do meu
avô encantaram e conquistaram de vez a espoleta da minha avó.
Passaram a se encontrar às escondidas do meu bisavô paterno.
Faziam planos, juras. A situação incomodava, pois meu avô não
queria faltar com respeito aos seus pais, por isso resolveu abrir o
jogo. Dá para imaginar, não?
Naquela época servir ao Exército Português significava ir
para a África por, aproximadamente, sete anos, no mínimo. Meu
avô e seu irmão não iriam escapar. Mas conseguiram. José, meu
tio-avô, com um cutelo, decepou dois dedos da mão direita e o
meu avô, com o coração despedaçado de amor e sem resistir ao
projeto do meu bisavô, foi " contrabandeado " para o Brasil.
Dois anos se passaram. Meu avô já estava em Minas Gerais,
empregado na Central do Brasil, muito querido pela sua seriedade e
honestidade, sempre solitário e tristonho, é lógico. Numa manhã
de domingo, feira na Praça, após a missa, Ouro Preto. Vovô desceu
as escadas da Igreja e seus ouvidos acenaram para uma música
conhecida, acompanhada por uma guitarra espanhola, castanholas,
gritos e palmas. Será? Taquicardia. Pernas bambas que demoravam
a se arrastar até o centro da Praça. Abriu passagem, educadamente,
na multidão e no momento em que uma rosa vermelha caía aos seus
pés. Abaixou, pegou a rosa e quando levantou os olhos para
devolvê-la, as lágrimas soluçaram em seu rosto e ele só conseguiu
dizer: Minha amada... A música parou, a dança parou, o mundo parou.
A irmã de minha vó casara-se com um brasileiro, oficial do
Exército, que fora transferido para Ouro Preto. Lá instalaram uma
Pensão para estudantes, negócio promissor. Minha vó e meu bisavô
vieram quase um ano depois. Naquele domingo era a primeira
apresentação só dos dois, com patrocínio da Pensão. E foi a única.
Dois meses e já estavam casados e residindo em Miguel Burnier,
distrito de Ouro Preto, onde o meu avô exerceria o cargo de Chefe
da Estação, com direito a moradia. A casa ainda existe. Fica numa
parte alta, com uma bela vista panorâmica. E foi lá, que quinze
irmãos depois, nasceu o meu pai, o caçula.
A história dos meus avós é mais que uma lição de amor,
cumplicidade, companheirismo, uma linda história que vou contar
devagarinho, prometo.