Conquistas irônicas de poder

Todo dia quando me levanto lembro que tenho de fazer as mesmas coisas triviais, mas nem sempre, na verdade quase nunca, que faço o que devia. Não sei porque não sinto a necessidade de seguir um paradigma que na verdade nem eu mesma sei. Nem sei o que procurar. Essa busca constante de algo. Alguma coisa que lhe dê, no momento, um poder absoluto, que faça com que todos seus medos desapareçam. Eles são apenas ocultados. As pessoas têm pavor de saírem de seus casulos, tornando-se um dia seres com lindas asas a observar todo caos daqui de baixo. Queria eu poder (olha só a palavra se verbalizando já, haha) voar para meu infinito. Chegar onde nem eu mesma previ. Sair desse estereótipo que é ser humano. Essa vulgarização de sentir-se rei, num momento em que castelos estão sendo destruídos para darem lugar à megas. É, megas. Megas construções, megas transportes, megas milionários, megas hipermodernos, megas globalização.

Eu, humano, sou apenas um. Uma parte. Mas querem que sejamos supers, também: super-homens, super-heróis... suprindo o que há muito já foi perdido. Querendo resgatar uma sensibilidade esquecida. O homem é sua própria essência, seu eu, que vai se desvencilhando em partes ao longo da vida para se tornar maior em seu tempo, mas não mega/super. É feio. É clichê demais. É ter de se adaptar a uma nova evolução das espécies, a ponto de retroceder, tornar-se tão primitivo quanto aquele homem lá das cavernas de anos e anos atrás, sabe?

Eu tenho tudo. Meus acessos são enormes (olha aí a superioridade novamente). A hipermodernidade te dá tudo de mão beijada. Pode até te dar um beijo na boca, se quiseres. Pode te dar casa, mulher, filhos. Mas é isso que você, humano, uma parte , realmente deseja? Deixar que façam suas escolhas sem ao menos refletir sobre essa velocidade esmagadora de atitudes a serem oferecidas. Estamos vivendo numa feira livre: os melhores preços são os mais vendidos. A qualidade importa? Um pouco. A quantidade aqui é a essência. Essência causadora dos “ãos”.

O ser perdeu a lógica. Perdeu a razão. Perdeu a sensibilidade. Perdeu seu eu, massacrado por eles. Perdeu a parte que se emociona ao ver o filho se apresentando na escola, ao invés de estar aflito ao celular fechando mais um negócio. Perdeu ser livre. Perdeu olhar a simplicidade sem debochar. Perdeu tanto que o verbo está desfazendo-se. Perdeu principalmente a capacidade de saber usar seus pontos e vírgulas para tentar reescrever mais um capítulo nesse lugar que não parará de girar, sem sairmos do próprio eixo.

Mariana Rufato
Enviado por Mariana Rufato em 15/12/2012
Reeditado em 08/07/2013
Código do texto: T4036996
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