MEU BONECO DE NEVE

Hoje, 11/12/2012, terça-feira, vimos nosso primeiro boneco de neve ao vivo, ali inerte no espaço onde o fizeram, o nariz de cenoura, cachecol no pescoço, luvas nas mãos, gorro na cabeça, olhos de ameixa, a boca fechada num sorriso maroto. Ele era exatamente como o enxergava nos desenhos de minha infância e tal quel nos meus sonhos mais profundos. Aproximamo-nos daquela estranha e mítica figura já sentindo o coração pulando no peito, tamanha a emoção que nos atravessava a alma, ríamos como se tivéssemos apenas cinco anos de idade, e também era como se o desengonçado e, ao mesmo tempo, terno boneco de neve estivesse de braços abertos a nos esperar para nos abraçar com ternura, falar algo até se entrássemos no delicioso universo da imaginação, e me dizer o quanto ele estava feliz por finalmente me ver e tocar tantos e tantos anos depois de meu primeiro contato com ele nas revistinhas Disney e nos desenhos animados de minha meninice lá num recanto escondido do Brasil. Por óbvio, não se tratava nada disso, claro, mas quem é que manda na imaginação de um sonhador, quem determina qual sonho podemos ou não sonhar, e por que não podemos acordar a criancinha que um dia, há muito tempo, fomos, mas que ainda continua brincando em nossos corações?

Alguém o tinha feito e vestido bem em frente a uma loja árabe em cuja calçada havia todo tipo de frutas e vegetais, de maneira que um rapaz da loja nos viu e entendeu nossa alegria, compreendeu nosso entusiasmo muito humano de quem transmite nos sorrisos a emoção da primeira vez, veio até nós e se ofereceu para nos fotografar. Foi a glória para dois corações brasileiros batendo em descompasso sobre o tapete de neve em que pisávamos e sob as gotículas estreladas da nevinha fina se debruçando do céu sobre nós, pois se naquele instante era exatamente tudo que queríamos! Apressamo-nos em nos posicionar, eu de um lado do boneco, Ana do outro, ambos em franco sorriso de plena satisfação. Afinal, vir à Suécia na época do Natal, a neve caindo sobre a cidade em abundância, se não aproveitássemos para sermos fotografados ao lado de um boneco de neve, nosso primeiro boneco de neve, talvez o último na vida, não sabemos, não teria muito sentido. Então o rapaz nos clicou depois que lhe entreguei minha máquina fotográfica e eternizamos aquele instante mágico, tiramos foto ao lado dessa figura lúdica em completo êxtase, feito crianças, em seguida saímos como a correr sob o olhar compreensivo do rapaz, que nos devolveu a máquina e a quem agradecemos a gentileza, pegamos um punhado de neve e jogamos amorosamente um no outro, enfim, fizemos tudo que um casal apaixonado, que se ama, costuma fazer quando passeia pelas terras do Papai Noel, por lugares onde o pinheiro em forma de árvore de natal é o original e o branco sobre os ramos é neve, não algodão - como no meu tempo de menino.

Abraçado a minha esposa, os flocos da suave chuvinha de gelo raspado flutuando sobre nossas cabeças, beijando-nos o rosto e grudando em nossas roupas grossas contra o frio gelado, olhei para trás e tornei a ver o boneco de neve na sua imobilidade morta, no seu silêncio indubitável, contudo pareceu-me vê-lo mexer as mãos como numa despedida ingênua, ou então foi minha alma infantil que desejou isso com afinco e obrigou-me os olhos a ver, a descobrir muito além das imagens concretas, a alcançar o mundo abstrato onde tudo que existe e está realmente lá sem poder ser visto nem tocado, somente sentido, percebido, sendo no entanto vívido e perceptível através da sensibilidade tão própria dos que são tocados pela força arrebatadora da ternura.

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 11/12/2012
Reeditado em 11/12/2012
Código do texto: T4030751
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