Assalto
Ela não costumava voltar tão cedo, por isso estranhei o barulho do motor chegando e estacionando em frente de casa, parei o que estava fazendo e fiquei afinando os ouvidos para o barulho que vinha da rua, a buzinada da trava das portas soou ainda mais familiar, era ela de fato, barulho de saltos apressados, chave no portão automático, abriu e fechou com aquele som peculiar. Um ritmo de caminhar diferente veio se aproximando pelo corredor da garagem, é era ela, totalmente fora do horário normal, entrou esbaforida pela porta, chorando e tremendo descontrolada com as duas mãos no peito as lágrimas escorrendo pela face, palavras inintelígiveis ditas sem muito controle, gritou fui assaltada pai, roubaram meus dois celulares.
Abracei-a com força e disse calma, calma, calma, tudo vai dar certo, lembrei de coisas da infância dela, pai carrega a alma dos filhos no peito, tudo que lhes acontece, melhor seria se tivesse acontecido conosco, queremos sofrer por eles, queremos livrá-los de todos os sobressaltos da vida, lembrei-me das vezes em que ela se assustou com alguma coisa, um inseto, um animal, sei lá, qualquer coisa, fazia tempo que não acontecia aquilo.
O que aconteceu ? Um cara com dois antebraços tatuados, loiro, olhos claros, com uma barba comprida entrou lá na loja e me apontou uma faca, disse alto, me dá o celular, em seguida cortou o cabo do telefone.
Disse-lhe, disca 190 e conta pra polícia. Enquanto ela discava, peguei o carro e fui dar uma volta pelo bairro para ver se encontrava o sujeito com aquela descrição. Andei uns 15 minutos e nada. Voltei pra casa.
Acabei de chegar e a polícia já tinha passado por lá com a descrição do sujeito loiro do 190, daí dez minutos, voltou com uma fotografia do elemento e mostrou pra ela.
A polícia conhece todo mundo que tem tatuagem, principalmente gente com passagem pela polícia, drogados, bandidos, moleque bagunceiro, tudo tudo.
Pediram para que ela os acompanhasse para reconhecer o sujeito. Ele já tinha cortado o cabelo, feito a barba e trocado a roupa que usou no assalto. Ela o reconheceu na hora, mesmo com a recauchutagem para disfarçar. A polícia deu uma prensa no sujeito que entregou os celulares, sim, ele pegou os dois celulares dela, e chorou arrependido de ter feito aquilo, seu intento era comprar drogas, trocar por drogas, fazia quinze dias que ele tinha saído do tratamento para livrar-se da dependência. A polícia diz que isso é impossível, para a polícia, o sujeito que se droga com crack jamais consegue largar, sei lá.
Tivemos que ir até a delegacia fazer o boletim de ocorrência. Rapaz, antes não tivesse ido, parece brincadeira, você fica numa sala esperando o escrivão te chamar, enquanto isso vão passando policiais e pessoas que trabalham lá, todos querem saber detalhes da ocorrência, todos te contam um pouco da vida do assaltante drogado que ameaçou sua filha, de como ele conseguiu destruir sua própria vida, a dos pais, a dos filhos, a da esposa e de tantas outras pessoas que cruzaram o seu caminho.
Olha, a droga é o mal encarnado na terra, nunca se meta com isso na sua vida, o rastro de destruição que ela provoca não tem quem pare.
Resumindo, ficamos horas por lá, fizemos o b.o. e depois mais um b.o. para receber os celulares "bloqueados" (bloqueei ambos) de volta. Ela vai ter que comparecer até perante o Juiz toda vez que for intimada. Sinceramente, não vale a pena ser assaltado. Ironicamente, nem pelo assalto em si, mas por toda a burocracia e pela imersão na verdade da vida que acontece nas delegacias, um mar de lama e problemas que marcam sua alma para sempre.
Lá tinha outros drogados, meninas de treze anos que fizeram assaltos, que roubaram lojas, carros, etc... etc... O palavreado que se ouve por lá é só desgraças e dissabores, definitivamente, faça tudo que estiver ao seu alcance para não ser assaltado.
Vamos rezar e pedir a Deus para nos livrar disso tudo. Amém.