TER MEDO....

O medo é a transgressão da vontade. O quê é isso?

É a inibição, compreensível, dos passos que queremos dar e o temor dos riscos abortam.

Aconteceu o primeiro julgamento dos matadores da Juíza Patrícia Acioli. Uma pessoa que nunca teve medo. Personalidade doce com os sentimentos e dura com os que transformam a bondade humana natural, já que nascemos inocentes, em hediondas condutas.

Corajosa, combateu os criminosos mais ousados, e foi tanta a ousadia que a mataram. O medo nunca foi sua morada.

O pior ocorreu, em alto e bom som. Diante de um plenário de júri cheio, presentes seus familiares, todos próximos de minha pessoa por laços de amizade, arrasados pela dor que conheço, desde o desaparecimento de Patrícia, ratifica-se o nível do denunciado pelo crime.

Ouviu-se a truculência do criminoso dizer cinicamente: EU NÃO TENHO REMORSO, TENHO ARREPENDIMENTO..

O que quis passar a rudeza desse ignaro criminoso? Desconhecia serem sinônimos os vocábulos ou pretendeu neutralizar o impulso de um mentiroso remorso?

Remorso é o abatimento da consciência que percebe ter cometido uma falta, um erro, que gera arrependimento, assenta o dicionarista Houaiss.

O silêncio seria a manifestação do arrependimento, do remorso, nunca a manifestação da ignorância.

O medo hoje faz magistrados migrarem de varas criminais para cíveis. Patrícia nunca o fez. Foi-se o tempo, e muito presenciei nesse sentido, em que um denunciado se dirigia ao magistrado mostrando hematomas e dizia respeitosamente, “excelência, apanhei na polícia”.

Hoje, em interrogatórios, ameaçam os juízes. Não intimidaram Patrícia, que ainda estudante defendia os mais fracos com desmedida coragem, buscando nos presídios os desfavorecidos que se achavam presos injustamente.

A sentença condenatória do primeiro denunciado julgado, foge ao tecnicismo próprio e tece homenagem à memória nobilíssima de quem se entregou ao mais árduo mister da humanidade, fazer justiça, e proclama ao final o decisório, sic:

“Ao encerrar deixo a técnica jurídica por um instante para fazer dois registros: .... ao caminhar pela história recente da humanidade, este julgamento remete o Magistrado às lembranças do atentado em 1981 contra João Paulo II em plena Praça de São Pedro, no Vaticano onde morava, que tanto debilitou a saúde do Santo Papa; a morte de John Lennon em 1980 quando voltava para o apartamento onde morava em Nova Iorque; e do evento que ceifou a vida do ativista ambiental brasileiro Chico Mendes, morto em 1988, com disparos de escopeta no peito, quando se encontrava na porta dos fundos de sua casa. Curioso dizer que ninguém se recorda dos nomes dos autores das respectivas tragédias e ao mesmo tempo, todos guardam na memória os nomes daqueles que foram atingidos - portanto, vivos e presentes. Sem saber a exata razão, neste momento embalado pelas lembranças que o impulso me leva a registrar, também me recordo do poema épico brasileiro I-Juca Pirama onde Gonçalves Dias exalta a coragem do jovem guerreiro, que para o caso concreto, se adapta à jovem guerreira. E, por fim, da canção de Geraldo Vandré, Pra não dizer que não falei das flores´. Tudo isso, em um turbilhão de ideias que chegam à memória, sou conduzido à conclusão de um fato público e notório:

Patrícia Acioli tem fortes elos com a eternidade, lugar comum destinado a quem, como ela, era talhada para função que exercia, cumprindo com firmeza a responsabilidade de bem servir à população, fazendo justiça. Que tua estrela ilumine o percurso em paz.”

Pertencemos todos à eternidade, acresço, uns serão mais lembrados, os que se imolaram por justiça, Patrícia é um desses mártires.

Celso Panza
Enviado por Celso Panza em 06/12/2012
Código do texto: T4023041
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