ENCICLOPÉDIAS AMBULANTES

Prof. Antônio de Oliveira

antonioliveira2011@live.com

Roberto Carlos canta: “Quem sabe menos das coisas sabe muito mais que eu”. Assino embaixo. De medicina, por exemplo, o povo entende mais do que os próprios médicos. No romance Moreninha, de Joaquim Manuel de Macedo, uma personagem, habitualmente sóbria, excede-se na bebida. Acreditando sentar-se numa cadeira, cambaleia e cai feio contra uma porta. Um tombo digno de uma videocassetada. O efeito da embriaguez, no caso, é interpretado como um ataque. Ao lado da cama onde deitaram a pobre vítima de bebedeira, começam as mulheres, de imediato, a proporcionar um delicioso receituário de palpites tiro e queda.

– Foi o jantar que não lhe fez bem... já estava na fraqueza...

– Quem olha no nariz dela vê logo que são maleitas! Uma amiga, que teve o mesmo mal, ficou curada depois de tomar cauda de cobra moída, torrada e em seguida desfeita num copo d’água tirada de um pote velho com um coco novo e com a mão esquerda, pelo lado da parede. É batata...

– Só pode ser lombriga!

– É estupor, ataque dos nervos!

– É o coisa-ruim, o espírito maligno que entrou no corpo dela...

Muita gente fala de todos e de tudo, e arrisca palpite ao deus-dará, e em qualquer lugar, alto e bom som. A essas pessoas se aplica a resposta do pintor grego Apeles, ainda no séc. IV a.C. Dizem que ele expunha seus quadros ao público, escondido atrás da tela, para ouvir os comentários. Certo dia, um sapateiro achou o que criticar: uma sandália. Até aí tudo bem. Apeles corrigiu o defeito. No dia seguinte, o mesmo sapateiro criticou outros detalhes do quadro. Aí o pintor saiu de seu esconderijo e disse, saindo também do sério: Sapateiro, não vá além dos sapatos.

Voltando a Roberto Carlos, dos conselhos que às vezes ouvia, a gente sempre fugia. Não queria entender. E num mundo de sonhos andava, achando que era o máximo. Só com o tempo, a gente aprende. Quando aprende. Assim, na verdade, “quem sabe menos das coisas sabe muito mais que eu”.