RIO EM UM DIA DO PASSADO

 
 
            Dez e quarenta, cheguei de volta ao apartamento do meu filho, que deve ter acabado de alçar voo em direção a Paris, e eu no recesso dessa casa que não tenho mais, mas que me é permitido neste momento ficar. Levei-o ao aeroporto, no seu primeiro bota-fora. Minha filha o aguarda em Hannover. Que Deus os proteja e guarde e que sejam ambos muito felizes.
            Tive insegurança de voltar ao abrigo deste lugar e momento, mas cheguei. Cheguei triste com fome de felicidade e de mim mesma. Parei o táxi um pouquinho antes da portaria, num bar aberto ainda com algumas poucas pessoas. Destoei dali, mas pedi um café para levar. Acabei comendo uma pizza brotinho e uma cerveja inteira. A música era violenta de ritmo, mas o pessoal do bar de pouca gente, daí a pouco mudou para Roberto Carlos, depois outras canções mais suportáveis. Percebi a gentileza deles que por seu lado percebiam ali uma pessoa que não era dali Não é a toa que adoro os cariocas. São as pessoas mais amáveis e humanas desse mundo.
            Eu não vinha, mas vim quando entendi que para ele era importante eu vir.
           
            Mas ainda tinha que ir pegar a restituição da Unimed na Rua do Ouvidor, o que fiz a pé, por ser ali pertinho. Que não tinha nada de pertinho e cuja direção e distância eu já perdera, pois eu já estava na galáxia das perdas passadas e do sentimento magoado de coisas que não sei mais. Foi outro tanto de roubo de mim mesma e, depois  tomei um táxi de volta à casa, onde deitei e dormi descontente e vazia. Um banho rápido e culposo e fui acompanhar meu filho ao aeroporto em seu primeiro voo.
            Mas eu desci a terra e à minha desdita e, graças a Deus, estou registrando esta derrocada e desvio de mim mesma, aqui neste meu Rio de Janeiro.
 
            Quando cheguei ontem, eu senti a cidade diferente. Hoje mais ainda e falei isso no ônibus para o Galeão, ao que meu filho perguntou: menos alegria?

            É.