A velha casa

Quase em ruínas sustenta-se orgulhosa entre sobrados recém-construídos e um grande prédio de vinte andares. A rua tranquila em que fora erguida já não é a mesma: som alto todas as noites, trânsito de veículos intenso durante o dia. Já não há mais as árvores frondosas que abrigavam passarinhos sonoros e festivos. Foram cortadas para dar lugar aos inúmeros cabos e fios exigidos pela vida moderna.

Ela continua lá, impávida, como marco de um tempo que já se foi, guardando dentro de si recordações, ecos de um passado, no qual tivera seu charme, fora elegante, símbolo de prosperidade...

Em suas paredes, corroídas pelo tempo, ainda traz os sinais, junto a todas as cicatrizes, das telas de grandes mestres que teve o privilégio de exibir, guarda, também, algumas marcas bem escondidinhas das mãozinhas das crianças que a habitaram pela última vez... Adorava as meninas e o menino que a alimentavam com seus sonhos e suas brincadeiras, enchendo-a de felicidade.

Sua escada branca, de mármore importado, tão imponente, agora tão maltratada, parece um sorriso banguela...

Mas continua lá, resistindo até o último fragmento de tijolo. Seu futuro é incerto. Agora faz parte de um inventário confuso e difícil que vem se arrastando por anos.

Chuvas, goteiras, calor, vizinhos hostis, nada a abate, pois ainda há dentro de si um restinho de amor, do amor que lhe fora dedicado por aqueles a quem abrigara por mais de sessenta anos.