ASPAS
Prof. Antônio de Oliveira
antonioliveira2011@live.com
Aspear significa pôr “entre aspas”. Há, inclusive, quem costume aspear com as mãos, reproduzindo esse sinal gráfico em forma de mímica. As aspas, aspeando, abrem e fecham textos transcritos, a modo de marca registrada, indicando que a composição tem dono, mesmo que aquela pessoa não tenha dito, escrito ou inventado aquilo. Se não foi, fica sendo. C’est la vie! Nem sempre La vie en rose. Nos casos de transação fraudulenta, é conhecido como laranja o agente intermediário cujo nome é usado para ocultar a verdadeira identidade de terceiros.
O protagonista da novela O Bem-Amado, Odorico Paraguacu, político corrupto, pra variar, demagogo e pretensamente erudito, costumava desfiar citações supostamente de autores famosos, como Rui Barbosa. Quando advertido por Dirceu Borboleta, seu secretário, Paulo Gracindo, digo, o bem-amado prefeito de Sucupira respondia: “Se ele não disse, deveria ter dito”. Taí a mania de citações. Ou mania de erudição. Ou ranço de universidade, ambiente acadêmico viciado em referências bibliográficas que a gente nunca sabe se foram consultadas, mesmo porque quase ninguém confere. No poema A Confissão do Erudito Moribundo, Geoffrey Strickland destila seu segredo de professor: o de sua ignorância que agoniza com ele. Aqui, pinçado, apenas um verso, revelador da desonestidade científica no que diz respeito aos livros citados e que nunca foram lidos: “The books I quoted and have not read”.
Além disso, preferimos ler histórias dos outros para os nossos filhos e netos a contar nossas próprias histórias. Citação não seria uma demonstração de nossa incapacidade ou medo de dizer, à nossa maneira, e de maneira assumida, aquilo que sentimos, embora já dito por outros? Usamos, então, uma capa com o nome pomposo de erudição. Por dentro, ora produto legítimo ora produto falsificado. Estaria eu falando de mim mesmo? Mas, deixa isso pra lá. A embocadura já está feita. Portanto, nada de preconceito sobre as aspas.