A negritude em mim


Um dia fui acusado por um leitor de racismo. Fiquei revoltado, porque sou descendente direto de Negros com N maiúsculo.
Meus bisavôs chegaram ao Brasil em um dos últimos navios negreiros a ancorar na costa brasileira. O patriarca da minha família era um menino de não mais que 10 anos. A nossa matriarca uma criança de colo ainda.
Aqui no Brasil os dois vieram para uma mesma fazenda no sul. Não chegaram a ser escravos, pois logo a princesa Izabel aboliu a escravatura, o que não significa que não trabalharam de graça por muitos e muitos anos.
Os dois jovens se conheceram, casaram e procriaram. O mais jovem dos filhos deles é meu avô, ou seja, filho de africanos legítimos.
Nasci com a pele clara porque meu avô se engraçou com uma polaca, e a filha deles, no caso minha mãe, preferiu se casar com um gringo. No final das misturas, nasci eu com a pele branca, o que não me transforma em menos negro que qualquer outro da minha família.
Eu sou uma pessoa privilegiada, porque tenho duas mães. E a minha mãe de criação também é negra e é uma das pessoas que mais amo nesta vida.
O fato de não ter nascido com a cor de meus antecessores fizeram com que eu passasse despercebido pelo preconceito e discriminação, mas nem por isso deixei de vestir a camisa em defesa dos negros com todas as minhas forças e como uma das minhas causas de vida.
O que as pessoas que acham que não existe preconceito, não entendem, é que 51% da população brasileira é formada por pessoas negras e pesquisas realizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) e pelo Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos (Dieese) mostram uma realidade mais precária enfrentada pelos negros no mercado de trabalho, em comparação com a enfrentada pelos não-negros, quando se consideram dados como as taxas de desemprego, a presença nos diferentes postos de trabalho e os valores dos rendimentos, entre outros.
Enquanto, por exemplo, na região de Salvador, 10,3% dos negros (pretos e pardos) ocupam cargos de chefia e a porcentagem entre não-negros (brancos e amarelos) é de 29,6%, na região metropolitana de São Paulo, essas proporções são de 4,4% e 15,7%, respectivamente (dados de 2002, apresentados no Boletim Dieese - Novembro de 2002). Para contextualizar, é importante notar que a presença da população negra é maior em Salvador (81,8%) do que em São Paulo (33,0%) (dados do Mapa da população negra no mercado de trabalho no Brasil, encomendado ao Dieese).
No final paramos para analisar; como pode a população negra ser maior que a não negra e por conseqüência a sua participação no mercado de trabalho ser muito menor. Sem contar que são raros os negros que ocupam cargos de chefia e gerencia.
Nos bancos universitários uma pesquisa aponta que apenas 18% são negros e que antes da lei de cotas, esse número era de 12%. Nas universidades públicas esse número antes era de apenas 7%. São dados não oficiais mas que servem de base. Já formados segundo o IBGE apenas 2,2% dos negros, enquanto os não negros registram 9,9% da sua população com curso superior.
Você sabia que enquanto 57% dos brancos que terminam o ensino médio entram no ensino superior, entre os negros somente 25% conseguem entrar na Universidade.
Claro que há a justificativa de que a população negra apesar de maior, é a com menor poder aquisitivo, o que acaba levando muitos dos jovens a trocar os bancos escolares pelo trabalho ou pelo crime.
Talvez isso explique o motivo de nossa população carcerária ser composta de 63% de negros e pardos.
Não estou na luta a favor da reparação dos anos de injustiça contra os negros, apenas levanto uma bandeira de justiça, onde os negros possam ao menos concorrer ao pé de igualdade com os não negros. Para mim isso é justiça.
Jonas Martins
Enviado por Jonas Martins em 20/11/2012
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