"AOS VINTE E NOVE DO SEGUNDO TEMPO"

(Crônica)

Autor: Floriano Silva

Pode continuar, é isso mesmo estou falando com você! Quem disse que o papo aqui é football? Já sei, o título te confundiu não é? Continua que já vai entender.

- Calma você! Não é assim não, a prova de que sou trabalhador tá aqui ó! Dedo estourado, calo nas mãos, perna russa de cimento. Eles são engraçados, nosso País está precisando passar por uma reciclagem geral para ver se as coisas mudam. Foi no final de mais um dia de trabalho que tal fato se deu, vinha eu de uma obra em Copabacana, cansado doido para chegar a casa, beijar mulher e filhos, tomar um banho e, berço, (dormir), passar na avenida cujo nome tem tudo a ver “Brasil” é isso aí, negro e de baixo poder aquisitivo, fazer o que, sim fazer o que, pergunto eu e logo respondo estudar ora bolas, hoje as revoluções são mais eficazes que outrora, acredito na transformação através da educação.

As tristes cenas se repetiram enumeras vezes,

- Documento negão.

- Aqui está senhor.

- Tem droga na bolsa?

Deveria eu está acostumado com o expediente, “autoridades”, “homens da lei” eles gostam de ser chamado desta forma, “senhor”, senhor não sei de que, mas quando não são atendidos, minha nossa! Sai debaixo que a madeira vai descer.

Foi no dia 21 de dezembro, data de meu aniversário, sim acordei bem cedinho, ninguém me viu sair de casa naquele dia, tomei o ônibus, como todos os dias religiosamente faço, caminhei vinte minutos para tomar o ônibus no ponto final, detesto viajar de pé.

Pausa para um adendo, não estranhe as colocações deste pião de obra, estudo desde os seis anos, aos vinte anos já estava eu formado em fisioterapia, mas a necessidade aliada à habilidade me conduziu aos serviços da construção civil com muito louvor. Voltando ao fato, cheguei atrasado ao serviço devido a um intenso congestionamento, tudo estava dando errado naquele dia, a massa ficou mole demais, o piso estava torto e para finalizar uma martelada no dedão do pé. Terminado o dia, hora de voltar para casa, dentro da condução um filme passou em minha cabeça, despertei com aquela lembrança, hoje é meu aniversário, caramba! Será que estão preparando alguma surpresa? De repente o ônibus parou

- O que será dessa ve...

- Vombora, levanta logo negão,

- Como é que é cabo E. Ducado não é esse seu nome?

- Mandei levantar o palhaço.

Nesse momento levei uma tapa no rosto, pensei na mulher no filho, foi quando ele me segurou e o sargento cujo nome de guerra era J. Honesto, desferiu um golpe com sua tonfa que atingiu de cheio a minha cabeça, desmaiei na hora, fui levado imediatamente para o hospital, operado as pressas e com a graça de Deus fiquei bom e sem sequela alguma, ah! A festa foi adiada, no dia que teria alta todos compareceram ao hospital para festejar a feliz data. Após minha recuperação repensei minha vida e revi alguns conceitos, foi quando passando numa movimentada avenida um outdoor chamou minha atenção, ele dizia “seja você também oficial da polícia militar”, busquei mais detalhes para a inscrição e percebi que minha idade estava no limite, faltava pouco para inspirar o prazo que impediria o meu ingresso.

Obtive o primeiro lugar na academia. Os anos se passaram e hoje estou tenente coronel, nome de guerra, “Malvadeza”, comandante geral do hospital central. Ah! Para conhecimento de todo, o sargento J. Honesto após uma tentativa de extorsão a um traficante foi atingido por um tiro de fuzil onde a bala se alojou na coluna deixando-o paraplégico, o soldado E. Ducado após tentar contra a vida de um trabalhador foi atropelado e socorrido, porém perdeu o braço esquerdo.

Por ironia do destino os chamados de “autoridades”, “agentes da lei”, responsáveis por diversas atrocidades contra trabalhadores, foram os responsáveis direto pelo meu ingresso na carreira policial, hoje os referidos deficientes encontram-se internados realizando fisioterapia e quis o verdadeiro homem da lei, “Deus”, que a recuperação de suas vidas fosse entregues justo a mim, vai entender casualidade? Destino? Prefiro acreditar que “Deus pode até cochilar, mas como tem o controle, rebobina a fita e corrige a cena”.

Crônica ou apenas conto?

floriano silva
Enviado por floriano silva em 16/11/2012
Reeditado em 16/11/2012
Código do texto: T3988828
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