AS PESSOAS DA SALA DE JANTAR
As pessoas da sala de jantar cantam a “Marselhesa” às duas horas e meia da manhã em uma primavera brasileira. Sangue índio, ou cerveja? As duas coisas, sendo que a gente não gosta de beber sangue, a gente não é vampiro. Paris nunca foi totalmente só branca, nunca foi sempre cidade luz.
Nosotros cantamos a Marselhesa e outras canções de amigo e de irmão, a qualquer hora,
sem cronômetro, sem linhas que possam limitar o que a gente pensa, sem métrica forjada ou a identidade poética que vem dos livros.
Somos uma usina de contar, cantar coisas de agora, atrás do que a gente está fazendo, integrado ao que a gente considera importante, bacana e maneiro.
Na sala de jantar a gente ouve os hinos que nunca foram cantados, as notas musicais que nunca soaram em um instrumento, uma dissonante incapaz de manter o nível da partitura, um vazio silencioso, como os ouvidos do surdo
Eu canto a Marselhesa às duas e meia da manhã, em Unamar. Com minha tia francesa ? Com minha tia do tempo em que éramos calados e magros? Eu canto como aprendi a cantar, como aprendi a respeitar.
Se tem circo, eu quero rir , quero gostar de ver o palhaço, tudo. Mas, se tem que ler um volume de livros, a gente vai ler também, com a mesma vontade.