Aos algozes do Velho Chico

     De um amigo de Neópolis, acabo de receber um cartão-postal daquela simpática cidade sergipana, com o Rio São Francisco ao fundo.
     Pela sua beleza e significado é um daqueles postais que deve ser guardado e não, depois de lido, jogado na cestinha de lixo. Geralmente, para não perdê-los de vista, costumo pô-los entre as páginas de livros aos quais volto sempre.

     No delicado cartão-postal, o amigo recorda, com todas as letras, nosso encontro às margens do grande-rio, antes d´eu atravessá-lo para uns dias de inadiável descanso no abençoado claustro franciscano, na acolhedora Penedo, do outro lado do rio.
Uma travessia que se faz em minutos, e sentindo, com intensidade prazer, a grandeza do Rio São Francisco na sua marcha rumo à sua foz, que depois conheci.

     Que conversei com o amigo. No papo de Neópolis dei-lhe conhecimento da minha indignação com a notícia da transposição das águas do Velho Chico, naquele momento em discussão no gabinete do presidente da época, o sindicalista Lula da Silva.
Nascido em Neópolis, o doutor Alfredo Santana concordou comigo em tudo. E resolvemos, ao final, lançar nossos protestos de forma individual, e como melhor entendessemos.

     O fundamental seria deixar patente nossa repulsa à ideia da transposição (...desde Dom Pedro) por considerá-la obra faraônica e que dificilmente chegaria a bom termo. Iria servir para alimentar ambiçôes político-partidárias  de alguns e a fome monetária de outros, todos de olho na fabulosa grana que sairia dos cofres públicos, quer dizer, do bolso do povo.
     
     Contra a transposição, na mesma época com a mesma força, levantou-se, numa atitude digna e corajosa, dom Flávio Luiz Cappio, bispo dá são-franciscana cidade de Barra, no Estado da Bahia, com repercussão internacional.

     Quem não se lembra do prelado - pertencente à Ordem dos Frades Menores - em greve de fome, acampado às margens do São Francisco, pedindo às autoridades que deixassem o grande-rio em paz. Autoridades, algozes do Velho Chico, debocharam do corajoso "não" de Dom Cappio, que insistiu na greve, até quando lhe foi possível.

     Como prometi ao amigo sergipano, escrevi duas crônicas - O bispo e o jejum  Com dom Luiz Flávio - hipotecando solidariedade ao destemido prelado.

     Volto ao cartão do amigo. Doutor Alfredo, nele, fez esta oportuna constatação, num tom bem coloquial: "Tá vendo, cearense, nós tínhamos razão."

     Com elfeito, o amigo sergipano, como eu, acompanhara o Jornal Nacional da Rede Globo evidenciando o fracasso das obras de transposição das águas do São Francisco, onde, como se sabe e vale repetir, foram gastos milhões de reais. Obras iniciadas, com "compreensível" estardalhaço, em 2007, e final previsto para 2012. O que não ocorreu...está tudo paralizado. Para os jornalistas que por lá passaram, está tudo "lireralmente  a-ban-do-na-do!"
Levando ao nordestino um desencanto dramático.

     Claro que me mantenho, sem tirar nem pôr, contrário à transposição.  Ao concluir,  faço duas indagações: a primeira, se não é o caso de se pedir a imediata intervenção da Controladoria Geral da União; a segunda, por que ainda há nordestinos votando nessa gente da transposição.
     De repente, será preciso chamar o Joaquim Barbosa.



 

       

Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 14/11/2012
Reeditado em 26/11/2012
Código do texto: T3986069
Classificação de conteúdo: seguro