Fora e dentro do Eixo Anhanguera
Fora e dentro do Eixo Anhanguera
“Para onde estava indo?” Pergunta aparentemente óbvia para quem tomou um transporte coletivo na capital. Ora, dentro do Eixo Anhanguera havia dezenas de pessoas. Passageiros de idades diferentes, destinos diferentes, passageiros...
Minha infinitude de pensamentos foi incomodada por um barulho irreconhecível. Já andei no “Eixão” inúmeras vezes e não consegui resgatar na memória aqueles ruídos. Bichos? Ratos? Adolescentes! Sempre contestadores, eles carregam o cetro da juventude, querem mudar o mundo, mas a mínima capacidade de defender uma ideia pode se esvair de forma tão ruidosa como aquela abordagem. Invadiram aquele ambiente locomotivo a fim de esculhambar as vozes omissas.
Ao olhar, de relance, aquela menina, de 15 anos, mais ou menos, vestida como pivete, não, ela é uma pivete com boné na cabeça, andar cheio de gingado sem ritmo, gíria, pequenos sons guturais, frases lacônicas que revelam o grupo do qual ela insiste em fazer parte, lembrei-me de Manu, menina travessa, que sempre viveu nos arredores de minha casa. Seus pais diziam não saber mais o que fazer com Manu. Diziam que a entregariam à própria sorte. Sorte? Ali, todos eram da mesma sorte. Que Sorte? Que sorte?
As portas do ônibus, escolhido entre tantos, foram obstruídas e uma logística eficiente e perceptível dominava aquela operação singular, mas plural. Cada indivíduo parecia cumprir seu papel com destreza: palavrões, gritos, xingamentos, berros, arrastões! “Dinheiro, celular, tênis, mochila, passa tudo seu filho da P”. A selvageria urbana ataca mesmo sem ser para se defender. Não seria uma defesa? De quem eles se defendem? Dos prédios, dos tênis roubados? Da panela vazia? Dos governos de ninguém? Da Educação não recebida? Do vício? Da insegurança?
Ser refém é ser nada, no meio do nada é estar dentro do Eixo. Algazarra! Muitos riem. Poucos entendem a piada. Gritos. “Passa o relógio!” Sem hora para tudo. “Seu Deus nunca fez milagre em mim, passa a bolsa, o bilhete da passagem, a bijuteria” O descrédito na fé, a falsa ilusão, tudo fora do Eixo. Por um instante (ínfimo instante) fiz nova leitura do evento e criei nova progressão. Se todos os seres se unissem silenciosamente contra os entes invasores desarmados, mal armados, teriam o controle da situação, o controle político de suas vidas. Libertar-se-iam do caos. Todavia havia uma resposta silenciosa e cristalina: ali havia seres, mas havia também entes desprovidos do pensar, do agir. Coletividade neutra!
Para onde mesmo que eu estava indo pouco importa. O importante é a travessia!