Eu, em coma
Seu Rodrigo, tá com frio?
Todo dia a enfermeira me perguntava a mesma coisa.
Eu não podia responder, ela sabia, mas pra que perguntava?
Meu acidente foi grave. Bati o carro contra um caminhão e por milagre sobreviví.
Durante o socorro que me foi prestado, com os paramédicos e pessoas comuns que se aglomeravam, eu podia observar praticamente tudo.
Algumas vísceras do meu abdomem estavam expostas, alguem falou.
Mas eu não sentia dor pelo que me lembro. Um grande sentimento de atordoamento e distanciamento do fato.
Não me sentia morto nem tampouco normal, pois meu estado era grave, mas via tudo acontecer à minha volta. Até quando, após adentrar a ambulância, alguém me aplicar uma injeção.
Apaguei. Só acordei, após 4 meses, num hospital.
Várias cirurgias, cortaram meu intestino e a minha barriga tinha que ficar praticamente aberta para facilitar os vários acessos cirurgicos que tinham que ser feitos, portanto o fechamento era inviável enquanto tudo não estivesse em bom estado.
Graças à Deus, sobrevivi. Mas vou relatar algumas coisas.
Duas técnicas de enfermagem conversando entre sí durante o meu coma:
- Esse ai já era. Não acho que vai aguentar não. Ao que a outra respondeu: - Que acidente miserável! Como ele conseguiu sair vivo? É casca dura!
Eu só fazia ouvir. Não conseguia mexer um músculo do meu rosto.
Me deixavam o tempo todo de fraldas por causa dos ferimentos que tinham que cicatrizar.
Um frio FDP no quarto pois o ar condicionado tinha que ficar no mínimo para não haver perigo de contaminação, infecção hospitalar,etc.
Às vezes eu ficava tremendo de frio e não podia reclamar pra ninguem.
É ai que entra a enfermeira que eu falei no começo:
Tudo bem seu Rodrigo? Tá com frio? Eu não podia responder, nem ao menos olhá-la. Ela saia e eu ficava esperando alguem voltar com um cobertor, mas ninguem voltava.
E eu com aquela fralda, morrendo de frio, rezando pra chegar uma visita, pois assim elas seriam obrigadas a me cobrir para não me deixar descoberto, de fraldas, o que seria um pouco constrangedor para todos.
As conversas eram sempre as mesmas e eu já estava de saco cheio. Se eu pudesse me comunicar mandaria todos pra p...
Só falavam do acidente e coisas que eu não queria mais ouvir.
Enfim, saí do coma e a enfermeira de sempre pergunta: - Tá com frio seu Rodrigo? No que eu respondo, sim, dá pra arranjar um cobertor?
Vou trazer. E realmente trazia.
Imagino como se sentem os espíritos tentando se comunicar conosco sem conseguir. (Teoria espírita) Quantas coisas dizemos para fazer alguem sofrer do lado de lá. Dá o que pensar,não é?
Ps: o caso é verídico, mas não é o autor e o nome não é o verdadeiro.
11/12