LA VIE EN ROSE

Pois é! La vie en rose, nome do salão de beleza, onde eu trabalhava no início da década de 80.

No Shopping Center da Gávea, no Rio de Janeiro.

Exatamente por três dias fez parte de nossa equipe de trabalho, uma moça de peculiar esquisitice, dizia-se enviada dos céus "dela", tinha como missão purificar aquele antro de luxúria.

No derradeiro dia, o salão fervilhava. Eu? Toda atenção à minha cliente.

Eis, aparece a sorrateira, com uma bandeja de café, oferece o pretinho básico e sai.

No instante em que a madame tomou o primeiro gole, talvez sentiu que entrou atravessado, ela ronronou; percorreu-me um calafrio, nosso olhos se cruzaram no espelho. Fiz-me discreta, mas, para meu espanto, ouvi em seguida um "groouum", levantei os olhos vagarosamente, assustei com um par de zóião arregalado, pedindo-me misericórdia.

Não me fiz de rogada, girei a cadeira, ajudei a descabelada se levantar, ela saiu sôfrega em cima do salto 15, atravessou o salão emitindo um som imperceptível "rriiirrriiii", com o mais lindo sorriso estampado no rosto e logo atrás, eu, por dentro esbaforida, por fora calmissíma, com o punho cerrado para dar a salutar porrada nas costas, com todo respeito.

O leitor que gosta de rir da desgraça alheia, pode até não acreditar, no entanto, a mensageira dos deuses estava à espreita, na antesala do toallete, ao deparar com aquela linda mulher, já sem riso no rosto e grunhindo como um animal acuado, decidiu por si só, a engasgada estava possuída por alguma entidade maléfica.

Rápida como uma gazela, voou no pescoço da entalada, para meu espanto vi saltar um téco de língua roxa e assim começou o suplício do exorcismo: - Sai dela satanás, não volte nunca mais!!

Esgoelava a vivente com autoridade. Eu, estarrecida com o quadro sinistro, fiquei sem reação, até que a entupida fitou-me com um olhar murcho e pidão, consequi sair daquele estado de perplexidade.

Disse -lhe entre os dentes: - A cliente não está encorporada, está engasgada, se ela morre nós duas é que vamos para o inferno...Saia da frente maldita!!

Penso ter adquirido a força dos endemoniados, desesperada, puxei a esganada e dei-lhe a fatídica porrada nas costas, a pobre diaba, corcoveou, pigarreou e fez aquela boquinha de chupar ovo.

Para que meu susto fosse maior, não só os olhos da mortaviva reviraram prá lá e prá cá como também se esbugalharam.

Subiu-me um arrepio na espinha, tive impressão; aquelas duas bolas estáticas, injetadas de sangue fossem pular do buraco.

O pânico tomou conta dos meus atos, perdi a compostura, dei-lhe um sopapo e gritei desnorteada:

- Gumita desgraçada!!

Chacoalhei a esbugalhada e com a desenvoltura de um bárbaro, levantei meu fino braço, sem dó nem piedade, desferi-lhe uma chuva de murros, à esmo.

Dessa vez a engasgada não pigarreou, nem corcoveou, mas, cacarejou descompassado. Por um raio de segundo marmorizei, em seguida, carquei o soco de misericórdia no espinhaço da infeliz.

Finalmente o café veio quente, meio esverdeado no rosto da exorcista.

A desengasgada se recompôs e voltou rebolando para o burburinho, eu atrás lépida e faceira.