Sabe com quem somos parecidos?

Não sou um admirador de Sigmund Freud, mas preciso concordar com sua teoria sobre a primeira infância. Ele tinha razão. Os primeiros anos de vida de uma criança e as influências que ela sofre formarão a base de sua personalidade.

 

Concordo plenamente. Afinal, é só olhar para minha história e atestar este fato.

 

Tudo que vi, ouvi e senti colaborou para a formação dos meus trejeitos e manias. Desde os meus pais aos amigos da minha irmã. Todos colaboraram para a formação de quem eu sou.

 

Apesar disso ninguém, absolutamente ninguém contribuiu mais para a edificação do intrínseco do meu ser quanto alguns personagens da cultura pop. A admiração que tinha sobre eles fez com que absorvesse inúmeras características que forjaram meu eu.

 

Sabe aquela velha frase:

 

- Quando crescer vou ser igual ao...

 

Cada um de nós tem seus preferidos. Todos já escolhemos alguém para admirar e se inspirar. O tempo pode passar, mas esta prática não termina. Apenas perde o impacto da época de criança.

 

Quando menino eu levava à sério as influências que escolhia. Nunca meus ídolos foram destrutivos para minha educação. Pelo contrário, colaboravam com ela.

 

Sempre escolhia os heróis. Não porque eles ficavam com as mocinhas no final. Mas pela força que os motivava. Não era conveniência ou admiração. As personalidades que inspiraram minha infância faziam o que faziam simplesmente porque era o certo a se fazer.

 

Quem eram eles? O Robocop, o Homem-Aranha e o Danrlei, ex-goleiro do Grêmio.

 

Cresci assistindo o filme do Robocop. Eu não sabia ler, o filme era legendado e o VHS não saia do vídeo cassete. A luta de Murphy para resgatar sua humanidade sempre me motivou a ser quem eu realmente era.

 

O Homem-Aranha foi o alívio da dura realidade que sempre vivi. Quando nasci meu pai tinha 41 anos, minha mãe 39 e minhas irmãs 18 e 12 respectivamente. Sempre fui solitário, impopular e um fracasso entre as meninas. Ver um garoto que sofria das mesmas coisas que eu, mas podia vestir uma fantasia e ser alguém melhor do que todos os que o ridicularizavam era (e ainda é) uma fonte de inspiração.

 

O Danrlei não foi apenas meu ídolo, mas o de uma geração.  Alguém que era apaixonado ao ponto de brigar por uma causa. Vê-lo jogar era como assistir a um homem defendendo a honra de sua esposa, devido à entrega e sacrifício com que se apresentava. É por causa dele que não sei fazer nada além de ser goleiro.

 

Aposto que enquanto lia estas palavras você também lembrou algumas pessoas que lhe inspiraram. Não quero ser inconveniente, mas preciso lhe dizer algo: você também não é parecido com nenhuma delas. Não se preocupe, eu também não sou parecido com os que admirava.

 

Eu não sei girar uma arma com o dedo indicador; não sei escalar paredes; não me tornei jogador de futebol. Eu não sirvo à confiança publica; eu não uso minhas habilidades com o máximo de responsabilidade; não salvo uma nação da derrota. Desculpe meu pessimismo, mas creio que você também não.

 

Sabe com quem somos parecidos na realidade? Com alguém magrelo, com pouco cabelo e bipolar. Somos parecidos com o Sméagol, da trilogia d'O Senhor dos Anéis.

 

Se você não o conhece, Sméagol é um dos principais personagens da trama. Ele é o responsável por conduzir indiretamente a jornada presente nos filmes e nos livros. Não quero me aprofundar, apenas constatar que ele é influenciado maleficamente pelo Um Anel, a fonte de poder das trevas. Por muito tempo ele o possuiu. Isso fez com que ele se corrompesse e se tornasse a vil criatura que conhecemos. Ele queria ser o melhor que pudesse quando encontrou seu "precioso", mas acabou se transformando em alguém frustrado.

 

Quando Frodo (o protagonista da história) chega à metade de sua jornada e encontra Sméagol, sua misericórdia faz com que a aberração assuma uma dívida de submissão. A tarefa de Frodo era destruir o Um Anel. Para isso ele conta com a ajuda de Sméagol. São nestes momentos que vemos sua semelhança conosco.

 

Sméagol é um mostro que quer ser bom, mas é constantemente tentado a se corromper. O que isso lembra? Você e eu.

 

Crianças que queriam ser heróis quando crescessem. Idealistas que prometeram a si mesmos que não se dobrariam a conformação adulta. Amantes da vida que juraram nunca ofendê-la.

 

O que se tornaram? Assassinos de sonhos, ladrões de esperança, incrédulos, conformados e destruidores.

 

Em meio a isso tudo travamos uma luta interna entre mudar e voltar à essência ou continuarmos os mesmos, inundados em frustrações.

 

Ah, você precisa concordar comigo. Somos ou não somos iguaizinhos ao Sméagol?