Livro dos Sonhos
Ela, Mariza, chegou toda contente. Deu um pulo no sofá — aquele ar adolescente. Trazia dois livros na mão; Horóscopo para o ano todo e um livro dos sonhos. Olhou o primeiro — não sei o que viu, mas fez uma cara ótima. Arremessou o coitado e pegou o outro. Folheou. Nada.
Parou, olhou para o teto — talvez tentando lembrar melhor do sonho —, não demorou muito e voltou a folhear o vidente. Dessa vez a busca foi mais detalhada. Encontrou. Fez uma cara de terror — profecia ruim, sem duvida. Decidi perguntar.
—O que houve?
— Esse livro idiota! – jogou o coitado no chão. — Diz aqui que vou me decepcionar.
— E você acredita nessa baboseira?
— Claro! O problema é que estou confusa; o horóscopo disse que “o dia está bom para conhecer novas pessoas”. E esse outro — disse como se tivesse nojo – diz que vou me decepcionar. Em qual confiar?
Rapidamente eu vi lógica naquilo tudo; ela faria novos amigos, e automaticamente iria se decepcionar. Com as “novas pessoas” ou com o próprio livro dos sonhos? Já fui adolescente e já acreditei nesses livros. Fui até meu quarto e abri uma bolsa de couro. Lá estava a minha coleção de revistas teens, como chamam — acho até um pouco gay, no caso de um rapaz ler esse tipo de coisa. Lá também estava minha playboy da Feiticeira – bons tempos! — e sem revelar muito de mim, encontrei um livro dos sonhos. Antigo, mas acho que ainda servia. Fui até a sala.
— Vê esse aqui. — mostrei o empoeirado livro pra ela.
— Xô ver…
— Não, acho melhor me contar com o que sonhou. — ela me olhou confusa, mas concordou.
— Sonhei com uma barata. — e nem fez cara de nojo.
— Com barata? — confirmou, estourando a bola de chiclete (pensei que fazer bolas de chiclete era coisa do passado). — E ainda assim quer que o resultado seja tranquilizador?
Ela deu de ombros.
Achei a parte da barata; mas sempre tem aquelas opções estranhas, seguidas de respostas sem sentido.
. Sendo a barata: vai descobrir um segredo.
. Matando uma barata: Vai tirar um inimigo do caminho.
. Comendo uma barata: Uma morte na família.
Não havia a opção exata, mas ela disse que era uma barata, no sonho. Até mudou a fisionomia; passou de raiva para interesse. Ela deve ter pensado que talvez descobrisse aquele segredo que as amigas andavam escondendo. Mas o rosto mudou do nada. Virou-se pra mim e perguntou: “Mas qual dos dois está dizendo a verdade?”. Fiquei impressionado. Ela tinha senso critico, ufa!
— Realmente não sei.
— Acho melhor confiar na melhor resposta.
— Acho mais saudável… — disse, aliviado.
Correu para o quarto — na certa já ia ver se descobria o tal segredo.
Os três livros estavam certos, ela só errou na ordem que leu.
Decepcionou-se com o livro dos sonhos, leu o meu e não notou que o segredo estava na cara, na palma de sua mão: que é perda de tempo ler esse tipo de coisa. E o horóscopo acertou quando disse que era um bom dia para conhecer novas pessoas. Acho que vou seguir esse conselho. Mas antes vou ver qual a cor da sorte para quem tem o signo de peixes. Faça o mesmo!