Estou ficando velha
''Todo mundo quer viver muito tempo, mas ninguém quer ficar velho''. Jonathan Swift


No filme, a cena é dramática. A dona lá confessa o crime e completa:
- Tenho 40 anos!

Olhei para ela com mais atenção. Pareceu-me tão acabada! Eu tenho 45 e não estou assim. Ou só atrizes já velhuscas representam quarentonas ou a impressão que eu tenho da minha pessoinha está bem defasada no tempo.

Corro ao oráculo, isto é, ao espelho. Algumas rugas, a pele perdeu elasticidade, os fios brancos se multiplicam como coelhos mas, no geral, ainda sou a mesma de sempre.

Começo a processar detalhes que possam ter escapado. Lembro da dermatologista que consultei por causa de uma alergia a picadas de insetos. Ela nem me deixou falar. Pôs um holofote na minha cara e informou, quase feliz:
-

Botox, ainda não. Mas vamos preencher aqui e...

Eu a interrompi, expliquei o motivo da visita, ela fez uma cara de “mas que precisa, precisa!” e rabiscou lá uma pomadinha antialérgica.

Agora, cada nova velinha no bolo me remete à cara de cera da médica - esta sim deve ter botox até no umbigo - que me deixou com a pulga atrás da orelha (mais pomada!).

Então, observo que os homens já não me olham mais, ninguém buzina quando eu passo...

O que denuncia minha decrepitude? São as roupas?

Meu Deus! É o bumbum! Já caiu? Não pode! Meu irmão dizia que eu era filha de marceneiro, tinha o bumbum embutido. Como é que um bumbum embutido pode cair a ponto de denunciar meus 45 anos?

Então, são os cotovelos! Devem ser cotovelos de velha! Taí a expressão, falar pelos cotovelos. Devem ser eles os primeiros a denunciar a idade da gente, esses fofoqueiros!

Bobagem brigar com eles. Decido não tentar prender os radicais. Eles são livres para irem onde quiserem. Provavelmente irão para a pele sedosa de alguma jovem como eu já fui. Fazer o quê? Os ponteiros giram para todos. Um dia, elas também perceberão que o tempo é inclemente.

Eu, pelo menos, fiz alguma coisa neste intervalo: estudei, trabalhei, criei, amei... Vivi, enfim! A vida tem preço. Felizmente, por enquanto, a moeda é o viço da pele e dos cabelos e não as colônias de neurônios. Mesmo porque eu tenho que... err... ahn...

Onde é que eu estava mesmo?

 


Crônica publicada no Jornal Alô Brasília em 20/07/2012, e reeditado do texto homônimo, publicado neste Recanto em 11/05/2009.