Faces da cidade
Eu vi um rosto na parede.
Mas não era um rosto comum, era o rosto do tempo.
Oculto por baixo da tinta descascada, revelou-se por pura ação do envelhecimento.
Do sol, da chuva, do vento.
Na textura do cimento exposto aos pedaços, da sujeira impregnada, da luz e da sombra, formou-se sua face: a imagem de uma caveira, materializada em seu próprio corpo de concreto, com sua ausência de olhos encarando a todos, porém, ignorada por aqueles que, ainda sobre a terra, estão soterrados de preocupações mundanas.
A sete palmos de distrações.
Um pequeno aviso camuflado, esquecido, evitado, temido, de que o tempo age lentamente e, mesmo invisível, está presente, vivo, constante.
E depois da última gota, emerge invencível sobre todos.
Invencível.
Somos a lebre, o tempo é a tartaruga. Por mais que a cidade corra, cedo ou tarde a ultrapassagem acontece.
Não há passado nem futuro, só a corrida, e sempre o mesmo vencedor.
Apreciemos o movimento, enquanto nos movemos.