O trabalho de História

Dona Elza, professora de História. Inteligente. Rígida. Justa. Culta.

Ali, no Colégio Arnaldo era a referência, o respeito, a dignidade. Como

se não bastasse, além de tudo, era linda, bondosa, alegre e sempre

participativa. Engraçado, como a memória age. Tantos anos já se

passaram, mais de quarenta, e eu a vejo pelos corredores, alta,

elegante, sorridente, decidida, perfumada, os cabelos louros

fartamente encaracolados até à cintura, uma deliciosa visão que

apaixonava a todos nós e casada com o professor de Geografia,

Sr. Marcos, formando o casal mais feliz do planeta.

Eu adorava a matéria, aliás, até hoje. Não só pela Dona Elza,

mas pela minha própria educação familiar. Meus pais, desde cedo,

me incentivaram à pesquisa, ao conhecimento, a literatura voltada

para a aventura que misturava ficção com realidade e ,assim, a

paixão pela História e Geografia se justificava.

Maria. Paixão da adolescência no Colégio Arnaldo. Rapaz e que

paixão, com direito a sonhar, a fazer poesias, a sentar bem pertinho,

a amar em silêncio, a fazer parte do mesmo grupo de trabalho, pois,

dessa forma, ficava mais junto, babando. Porém, dado à minha

timidez, nunca me declarara. E nunca a vi de papo a dois com

algum colega de classe ou do Colégio. Isso me dava esperança.

Dona Elza passou um trabalho individual. Versava sobre a crise

do algodão nos Estados Unidos antes da queda da bolsa, em 1929.

Não vi dificuldades. Mas a Maria, sim. Queixou-se comigo, quase às

lágrimas. Era a minha chance. Não iria perder a deixa. Claro que não.

Passei o meu trabalho pra ela e disse-lhe que fizesse uma adaptação.

__ Mude as frases, os parágrafos, use sinônimos...

E enchi o meu peito de orgulho e esperança.

Dona Elza adentrou a sala sorridente, cumprimentou a todos e

foi entregando os trabalhos com as respectivas notas. Mas para

mim, Maria, Paulo, Lúcia e Arnaldo ela disse querer uma reunião,

após a aula. Fiquei tenso. Senti que vinha bronca. E das pesadas.

Dona Elza era rígida, justa, séria.

__ Eu dei zero para o trabalho do Roberto e para vocês... Eu não

preciso dizer porque, não é mesmo?

Olhei para a Maria que chorava junto com a Lúcia. Fiquei mudo e

sozinho na sala minutos depois. No outro dia, ouvi do Arnaldo.

__ Aqui, Beto, desculpa cara... Eu sei que você gosta da Maria e

quis ajudar, mas a Maria gosta do Paulo que gosta da Lúcia que

gosta de mim... Sacou?

Saquei.