A hora e a vez da vidraça

Sedento para extrapolar os limites da verbalização daquilo que se alojou nas entranhas da racionalidade e se contrapôs ao ímpeto dos sentimentos que imploravam pela subversão das ideias, originadas pelas percepções da realidade imunda e desnuda de moralidade e ética, não me abstenho a externalizar o que convém para o momento.

Não obstante a aparente veia revolucionária e revoltosa das citações anteriores, enfatizo somente o meu furor súbito pela necessidade da escrita, que se transforma em um constante frenesi, aliviado nas páginas deste instrumento de comunicação.

Cheguei ao cume da impulsividade em registrar meus teoremas filosóficos sobre a existência humana quando presenciei acidentalmente - apesar da curiosidade inerente ao homo sapiens sapiens - um bate-papo descontraído entre amigos, no habitual retorno do trabalho.

Num grupo de aproximadamente - não cheguei a contar a quantidade de interlocutores - 5 pessoas, no momento em que me aproximei dele, entrou-me pelas vias auditivas a seguinte frase: "...ah...mas não tem jeito não...é tudo igual! É tudo ladrão!", proferida por uma mulher, a qual foi prontamente rebatida pelo comentário de um rapaz..."mas não são todos...a maioria...apesar de que até a gente se entrasse lá iria roubar também!"...o que foi complementado pela mesma mulher, quando falou..."é, disse tudo"...

Face ao diálogo deveras "motivador", passei-me a questionar e analisar o complexo universo do comportamento sociocultural do cidadão brasileiro...

O senso crítico do habitante deste país ainda em desenvolvimento (e minha conclusão - sem muito esforço - é que há um caminho demasiadamente grande a seguir até que se possa concluir que chegamos a um patamar adequado para nos auto intitularmos como desenvolvidos - com algumas exceções logicamente em áreas diversas, as quais podemos até nos orgulhar...) é um ser de diversas faces, as quais possuem uma ambiguidade por vezes inócua, mas em alguns momentos escabrosa, pois fere qualquer decoro.

O ato de se "atirar pedras" contra os maiores inimigos de nossos valores éticos, cívicos e morais torna-se uma prática que beira o lúdico, perante ao prazer que se emana das conversas de "roda"...citando-se apenas e tão somente os assuntos politicamente corretos...se ampliarmos o leque de discussões, nos deparamos no limiar da baixaria, onde qualquer terceiro faz o papel de "Judas" a ser malhado.

Mas quando o assunto é ética, moralidade, civilidade ou afins, a abordagem depende muito de uma série de questões, principalmente a de cunho geográfico, ou seja, do lado onde o envolvido está. É natural do ser humano batalhar pelos seus interesses pessoais, relacionados aos seus objetivos e metas, mas há que se contrapô-los sempre aos de seu semelhante, de forma que não haja prejuízos para ambos. O que não queremos para nós não podemos nunca desejar aos outros...mas na prática isso não é o que sempre ocorre...infelizmente.

Todos possuem livre arbítrio para fazer o que bem entendem, desde que suas ações não extrapolem os limites legais, pois toda ação possui em contrapartida uma reação, proporcionalmente positiva ou negativa com base em sua origem.

Daí vem a máxima: "se questionamos alguém por sua atitude, nossas ações têm obrigatoriamente de gerar exemplos inversamente proporcionais".

Não faz sentido algum criticarmos os políticos corruptos que nós escolhemos para nos governar se no dia-a-dia pensarmos em tirar vantagem de tudo, mentirmos para esconder nossos erros, furarmos filas, sonegarmos impostos, desrespeitarmos os direitos dos cidadãos, jogarmos lixo em locais impróprios, comprarmos produtos piratas, apoderarmo-nos de bem alheio, vendermos nosso voto, entre tantos outros atos inapropriados, com subterfúgios do tipo "se quem deveria dar o exemplo não faz, porque eu farei - referindo-se aos políticos", ou "eles roubam demais de mim...é meu direito pegar o que é meu!", ou ainda, "ninguém faz nada por nós..."...desculpas não faltam...

Recentemente, tivemos o prazer inicial de ver na mídia a professora potiguar de português, Amanda Gurgel, encarando de frente políticos na Assembleia Legislativa, ao expor sua indignação com o nível de tratamento do governo à educação brasileira, virando uma heroína nacional em pouco tempo, face à repercussão de seu discurso, o qual confesso me emocionou. A profissional docente bombardeou a "vidraça" parlamentar com "rochas" certeiras e inquebráveis.

Curiosamente, navegando por sites que expuseram o fato na época, li um comentário de um anônimo que dizia algo como "...só espero que ela não se utilize de sua recente notoriedade para ser candidata política!", o que, após quase dois anos, profeticamente, se concretizou.

Candidata à vereadora em seu estado, especificamente em sua cidade natal, Natal, fez com que as contradições numéricas expostas em seu discurso inicial (seu salário de 3 dígitos - 930 reais - com os números estatísticos apresentados na audiência pública pelos deputados) novamente ocorressem, adversando os algarismos de seus vencimentos na época com a quantidade expressiva de votos que conquistou - 32.879 - e porque não dizer também de seu futuro provento como vereadora.

Todos sabem do axioma popular que diz "uma só andorinha não faz verão", mas cabe lembrar à nossa fiel escudeira/armígera que seu escudo hoje é de vidro...

Acompanhemos.

Marco Dorta
Enviado por Marco Dorta em 21/10/2012
Reeditado em 22/10/2012
Código do texto: T3943856
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