Uma croniqueta de fim de semana
Fim de semana? Basta estar em casa. Minha casa - proteção e muralha. Quem se autodefiniria solitário estando em casa? Aqui estão os livros (Drummond à cabeceira, um caminho percorrido num Saramago e outros títulos à espera), discos, fotografias – dos ausentes e presentes -, a TV e um programa agendado; sim, estão também os filhos, a família, o aconchego do abraço - da ausência breve, e o diálogo esperado por toda a semana.
Minha casa, meu habitat. Dos vizinhos, não tenho notícias. Avisto de longe os telhados, pequenos pontos perdidos no anonimato. Das notícias, prefiro não sabê-las – principalmente sobre as más, pois o espírito se fragiliza, queda diante da dor do mundo. Por que um ataque contra uma criança indefesa no Paquistão? Essa história me lembra duma outra menina – a menina que roubava livros, de Markus Zusak. Nela, mesmo a morte tendo a visitado por diversas vezes, a menina saiu vencedora – tendo partido apenas no fim. É ficção. Sobre a menina de agora nada sabemos de seu destino fortuito. Preceitos religiosos não deveriam admitir tamanha desumanidade.
A ficção talvez seja a melhor saída para nos alentar. Ela serve de válvula de escape, pode humanizar o homo sapiens. Antônio Cândido, escritor, crítico literário, sociólogo e professor, nos presenteia ao dizer que “A literatura desenvolve em nós a quota de humanidade na medida em que nos torna mais compreensivos e abertos para a natureza, a sociedade, o semelhante”. Creio eu que a arte cinematográfica tem a mesma função. É por isso que as histórias de amor, perdão, superação e esperança são aplaudidas por toda a gente do bem.
E um bom fim de semana fica esplêndido quando acompanhado por “Ana e o Rei” (com Jodie Foster, Chow Yun-Fat, direção de Andy Tennant, 1999); “Amor além da Vida” (com Robin Williams, Max von Sydow, Cuba Gooding Jr., direção de Vincent Ward, 1998); “O Jardineiro Fiel” (com Ralph Fiennes, Rachel Weisz, direção de Fernando Meireles, 2005), “A troca” (com Angelina Muniz, direção de Clint Eastwood, 2009).
Eis aqui a minha croniqueta sobre o amparo que nos guarda de todo o mal a cada fim de semana – a nossa casa. Chamo de croniqueta, lembrando um conceito dado por Luís Fernando Veríssimo, excelente cronista, autor gaúcho, para ele “Croniqueta não é o nome científico da crônica curta, como pode parecer. É uma crônica inconsequente, geralmente sobre coisa nenhuma, escrita com desinteresse para ser lida com pouco caso e cara de nojo. Se muita gente recorta crônicas do jornal para guardar, muitos recortam, cuidadosamente, a croniqueta para atirar no chão e pular em cima, gritando argkght!”
Ainda assim, me exponho. Mas não a recomendo a ninguém.