A TEORIA DAS COISAS SIMPLES

Vi uma senhora, num dia que não recordo, no centro de Recife, vendendo espetinhos. Fiquei observando, encantado, o jeito de trabalhar dela. Tudo era impecável, higiênico, honesto até os ossos. Os espetinhos, cordados exatamente do mesmo jeitinho. O refrigerantes, limpos, brilhando num isopor branco como o sorriso dela quando entregava a comida ao cliente; e era engraçado que ela mal olhava o dinheiro: ficava espiando o gesto de aprovação do comprador, e estava claro que ele gostava de dar alegria mais que de ganhar sua graninha sagrada – salve o fruto do trabalho, amém.

Que diferença haverá entre um escultor, um pedreiro, um poeta, um pintor, um músico e a senhorinha simpática que vende pequenas alegrias às pessoas? Nenhuma, se nossos olhos forem simples; e se nossos olhos forem simples, verão que a perfeição, a profundidade, a extrema religiosidade não estão apenas em pintar um teto de capela, compor uma sinfonia ou escrever um clássico. Nada disso. A obra, porque não tem carne, é uma ilusão. A fama, porque só existe nos outros, é outra ilusão. Vale só o ser humano, bicho desencontrado que teima e livrar-se da beleza; mas há desses bichos que, feito a senhorinha da barraca, quanto mais beleza atiram pelas mãos fora, mais bonitos ficam.

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