= Meu amigo Pachequinho =

= Meu amigo Pachequinho =

Tudo começou nos anos oitenta quando pediram-me um trabalho de abordagem a um alcoólatra. Ele era um ferroviário aposentado, que havia se perdido nos encantos do álcool.

Foi uma longa conversa. A princípio, ele se debateu, não queria falar sobre este assunto. Aos poucos, usando de sutileza, fui conseguindo tocar neste terrível mal, o alcoolismo. Pedi que ele ouvisse o meu desabafo, ele prontamente, pensando que iria me ajudar permitiu. Contei todo o meu drama de vida, por varias vezes fui interrompido, pois ele estava passando pelo mesmo drama. Aos poucos consegui localizar, nele, o veio de sua sensibilidade. Daí foi fácil convencê-lo a me acompanhar numa Sala de Alcoólicos Anônimo. Começou ali o seu novo ciclo de vida plena e produtiva.

Conheci os seus filhos, dentre eles o caçula, Pachequinho. Ele era um bom rapaz, inteligente, trabalhador, meio indomável, não aceitava nada de goela a baixo. Fizemos uma boa amizade. O tempo foi passando, o pai de Pachequinho se manteve firme até a morte, vinte anos depois.

Mas aquele meu amigo fora apresentado ao álcool, foi um amor ao primeiro gole. Pachequinho se inveterou nas bebidas. Em curto espaço de tempo, ele se degradou tanto, que pouco sobrará daquele moço forte e inteligente. Deixou de trabalho, a família, os amigos e se ajuntou com aqueles colegas de infortúnio. Lutei desesperadamente para salvá-lo, mas foi em vão. Ele se tonou arrogante, prepotente, característica da doença do alcoolismo. Numa certa manhã, estavam eles, (Pacequinho e companhia), sentados a beira de um passeio, uma garrafa de cachaça entre eles, quando parou um viatura da polícia. Colocou-os de pé para revistá-los, meu amigo ficou olhado aquilo tudo com olhos de desprezo, sentia muito importante para ser revistado pela policia.

Um dos soldados chegou de frente a ele e disse: _ Sargento, este aqui esta armado. _Não senhor eu nunca usei uma arma, -retrucou Pachequinho. _Olha senhor o volume na altura da cintura dele. _ Não senhor, isto ai é uma pequena protuberância. (uma hérnia umbilical).

_Não satisfeito o soldado mandou que levantasse a camisa. Ao levantar, o soldado assustou-se com o tamanho da hérnia e fez a infeliz comparação: _Nossa... Que tamanho! É maior que o meu pinto. –Pachequinho prontamente lhe respondeu: Eu não tenho culpa se você tem um pinto tão pequeno. _Isto lhe redeu alguns empurrões, até mesmo tapas na orelha.

Os soldados vendo que nada poderiam fazer ali, deram uma meia volta e se foram, deixando-os em paz a mercê do álcool.

No ano de mil novecentos e noventa e nove, escrevi um livreto com o titulo, “TAJETÓRIA”. Apesar de uma pequena tiragem, fez um relativo sucesso aqui na redondeza.

Certa manha eu estava passando perto da turma do gole e lá no meio, o Pachequinho, ao ver-me, parou-me, dizendo que ouvira dizer que eu havia lançado um livro, e que, algumas pessoas ao lê-lo, deixaram da bebida. Fiquei olhando para ele e senti um breve lampejo de esperança, que sabe agora é vez dele parar? Perguntou-me se eu vendia um livro para ele, eu disse que lhe daria um livro, com todo o prazer. Ele se irritou, disse que eu estava fazendo pouco caso, que ele tinha dinheiro e não precisava de esmolas. Com muitos dedos, fui contornando a situação, disse que ele era um dos meus melhores amigos, e que, seria um grande prazer presenteá-lo. Cheio de vaidade apresentou-me para os seus amigos, como escritor e um verdadeiro irmão para ele. No dia seguinte fui até a sua casa para lhe entregar o dito cujo. Sua mãe não me reconheceu e disse que ele não estava. Tirei o livro da pasta e entreguei aquela sofrida mãe, para que entregasse a ele. Ela gaguejou, depois admitiu ter mentido para mim, pensou que eu havia ido chama-lo para beber, pois aquele era o único convite que ainda recebia. Mas na verdade ele estava apagado, curtindo a sua ressaca.

Dois dias se passaram, estava eu em uma reunião, fazendo a minha partilha, quando alguém invadiu a sala, era o Pachequinho e outro da mesma turma. Pedi a todos que ficassem calmos, convidei-os para se assentar bem lá na frente. Obedeceram-me e ficaram ali olhando para mim. Pachequinho rompeu aquele silêncio e disse que eu havia lhe dado o livro de presente e não tinha feito uma dedicatória. Abracei com ele, pedi o livro, disse que faria naquele mesmo instante. Coloquei o livro sobre a mesa, peguei a caneta e comecei a escreve. Pachequinho deu um grito e caiu no meio da sala em convulsão. Ligamos para o resgate, ele olhava-me triste, com olhos de despedida. Fui escrevendo a dedicatória e falando em alta voz para que ele ouvisse o quanto o amava. Quando terminei, pontue o texto com as minhas lágrimas, aquele Ser sofrido acabava de se libertar do seu sofrimento. Ele faleceu, era dezembro de mil novecentos e noventa e nove.

Quando me lembro de Pachequinho, faço novas dedicatórias em voz alta e pontuo com as minhas lágrimas de saudade.

Antônio José Tavares. (Tonho)

ANTÔNIO TAVARES
Enviado por ANTÔNIO TAVARES em 18/10/2012
Reeditado em 09/06/2013
Código do texto: T3939812
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