Outro dia eu li

Eis algo que todos queriam saber. Por que as pessoas continuam elegendo e reelegendo os mesmos políticos prepotentes e que comprovadamente não fazem nada para diminuir as desigualdades sociais, pelo contrário, ainda alimentam a rede de privilégios para uns poucos?

Há certa explicação psicanalítica, que outro dia eu li. Um tal de mecanismo de identificação com o agressor. Parece absurdo, mas não é. Quando nosso modelo de identificação e objeto de referência é o agressor ou o oponente, tentamos (de uma forma totalmente destrutiva) ficar mais próximos ou parecidos com eles. Imitamos seus símbolos de poder para diminuir o abismo da indiferença. Essa tentativa é para que nos tornemos menos visíveis como ‘diferentes’ do agressor, e assim evitar que ele nos persiga ou nos destrua. Tudo isso de forma inconsciente, claro. No Brasil, temos uma infinidade desses nossos cidadãos passivo-masoquistas, basta olhar o resultado das eleições.

Esse vínculo, que se inicia na relação mãe-bebê por ser o humano frágil e absolutamente dependente de outro ser humano que o ampare em seus primeiros anos de vida, acaba sendo repetido por estar inscrito no inconsciente como modelo, estabelecendo uma relação dominador-dominado. Esses aspectos de nosso ser, quando alienados de nossa consciência e trabalhados ideologicamente pelo social, costumam ser repetidos compulsivamente, favorecendo a perpetuação da desigualdade.

Podemos dizer que as pessoas que não tiveram um desenvolvimento saudável, envolvendo fatores como famílias desestruturadas, pouco acolhimento pela ”mãe-sociedade”, baixa autoestima, e uma pitada de ignorância geralmente continuam repetindo esse padrão, expressando continuamente sua pulsão de morte, e definhando suas existências.

“A desalienação interna é necessária para o passo seguinte, a desalienação externa, que permite olhar criticamente para o social, buscando a verdade que se esconde atrás das camadas de mentiras e ilusões que a ideologia oficial cria e a mídia propaga(...). Não acreditamos em mudanças coletivas, impostas de cima para baixo, mas sim em um caminho inverso, lento, mas seguro e contínuo, de crescimento de indivíduos que se transformem em modelos identificatórios amorosos, que inspirem outros indivíduos e assim por diante”.

Afinal, quem nunca admirou a coragem e o amor incondicional de Gandhi, Buda, Jesus? Há outro grande problema aqui em nossa sociedade, onde ser bom é visto como sinônimo de ser burro. O amor não tem espaço na corrida tecnológica. O capitalismo mostra seus sinais de desgaste, os ricos estão depressivos, o mundo todo está num permanente deslanche de desastres. Há medo e tensão enquanto estamos trancafiados em cubículos que julgamos ser seguros. Olhamos pela janela disfarçadamente achando que o mal não pode nos atingir.

Até quando ficar indiferente à barbárie e fingir que não é com você? Essa indiferença não lhe parece à mesma moda dos governantes? Você e eu fazemos parte disso. Criamos isso. Você e eu podemos mudar isso.

(Crônica a partir do artigo "A construção da subjetividade na metrópole paulistana: desafio da contemporaneidade", de Sueli Damergian)

Camila Satine
Enviado por Camila Satine em 16/10/2012
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