Por que Perdemos a Copa de 1950

Muito tem sido escrito e falado sobre o desastre de 1950. Entretanto, creio que nem todos foram sinceros no relato dos fatos, no apontar dos erros grotescos cometidos na convocação da seleção que iria defender o Brasil na Copa de 1950.

Como a C.B.D. era sediada no Rio de Janeiro (a atual C.B.F. ainda o é) e o C. R. Vasco da Gama era o grande time carioca da época, o bairrismo carioca determinou os nomes dos 22 jogadores para a Seleção, e São Januário virou a casa da seleção Brasileira.

Precisamos lembrar que um ano antes, em 1949, ganhamos um inexpressivo Campeonato Sul-americano, sediado no Brasil, sem a presença da Argentina e contando com o Uruguai com uma equipe que hoje seria considerada sub-20.

Nesse campeonato, o Sr. Flávio Costa, o todo poderoso técnico da Seleção Brasileira e do Vasco, mexeu tanto na equipe brasileira que depois de goleadas impostas à Bolívia, ao Equador e ao Peru, perdemos para os Paraguaios e tivemos de disputar uma partida extra com o mesmo Paraguai, quando vencemos por 7x1 e nos tornamos campeões sul-americanos de 1949.

Foram tantas as mexidas na equipe que quase não tínhamos uma base para a Copa de 1950. Esse Sul-americano serviu, pelo menos, para despontar ou confirmar a classe de vários craques como Nena, grande zagueiro central gaúcho, ou como Mauro Ramos de Oliveira, do São Paulo F. C., zagueiro central, também, que deslumbrava a todos.

Podemos lembrar também de Tesourinha, também gaúcho, e de Cláudio Cristóvão do Pinho, que foram os pontas da Seleção de 1949, e que demonstraram toda a sua categoria. Havia os dois Santos, o Djalma e o Nilton, já com toda a força e talento para atuar numa Seleção Brasileira, pois ambos davam todos os domingos verdadeiras aulas de como se jogar nas laterais. Djalma Santos, lateral direito, jogando pela Portuguesa de Esportes e Nilton Santos, lateral esquerdo, atuando pelo Botafogo do Rio.

A Seleção do Sul-americano de 1949 ainda contava com o ponta esquerda Simão, titular absoluto que era uma revelação na Portuguesa de Esportes, reconhecido como o melhor ponta esquerda do Brasil, à época.

Na formação da Seleção para a Copa de 1950 já começamos a perder.

A burrice do senhor Flávio Costa achou que Djalma Santos era lateral direito e não zagueiro e que Nilton Santos era zagueiro e não lateral esquerdo. E no Vasco e na Seleção a composição era diferente. Flávio Costa não enxergava que tanto Djalma quanto Nilton marcavam os pontas adversários, um na direita e o outro na esquerda.

Assim, o Senhor Flávio Costa formou uma defesa com Barbosa, Augusto e Juvenal; Bauer, Danilo e Bigode.

Flávio foi buscar Juvenal no Flamengo, ainda despontando, para a zaga central, que deveria ser de Nena, pelo que apresentara no Sul-americano de 1949, ou deveria ser de Mauro Ramos de Oliveira, infinitamente superior a Juvenal. Na zaga direita Augusto não poderia ser comparado a Djalma Santos e Bigode na esquerda seria um absurdo jogar e deixar o mestre Nilton Santos na reserva.

Então vinha a linha atacante. O trio central formado por Zizinho, Ademir de Menezes e Jair da Rosa Pinto era, até aquela época, considerada a melhor linha atacante de todos os tempos. Bastaria colocar na ponta direita Cláudio Cristovão do Pinho ou Tesourinha e na ponta esquerda colocar Simão. Estaria pronto um ataque mortal para a Copa.

Porém o bairrismo carioca falou mais alto e o senhor Flávio Costa, comissão técnica e presidente da CBD não olharam para a Seleção Brasileira. Chegamos à Copa e na partida contra a Suíça, no Pacaembú, em São Paulo, num empate sofrido por 2 x 2, a Seleção entrou com Alfredo na ponta direita. Alfredo era reserva de lateral esquerdo, no Vasco. Os cariocas brincaram com a seleção não mostrando a menor seriedade com os jogadores.

Então chegamos ao jogo contra a Seleção uruguaia que tinha uma direção firme e jogadores de muito brio. Mas o Uruguai era tecnicamente inferior ao Brasil. E deu no que deu. Perdemos dos uruguaios quando só precisávamos do empate e ganhávamos por 1 x 0 até os 20 minutos da etapa final.

Os cronistas cariocas e os esportistas do Rio de Janeiro já davam o Brasil como campeão, pois a Seleção havia vencido a Espanha por 6 x 0 e a Suécia por 7 x 1. Na fase de grupos o Brasil vencera a Iugoslávia por 2 x 0, numa partida tensa.

No futebol, entretanto, não se faz tantas coisas erradas e ficasse impune.

Um detalhe importante: nos três jogos anteriores (Iugoslávia, Espanha e Suécia), o Brasil ficou concentrado longe do centro “nervoso” do Rio de Janeiro. Mas contra o Uruguai o Brasil ficou concentrado no Centro do Rio. Foi um carnaval a noite toda. Fotografias de jogadores com artistas, políticos, dirigentes com suas famílias posando com jogadores. Jantar a meia noite. Liberdade total e desrespeito ao horário de descanso dos jogadores. O preparo físico e psicológico da equipe estava à zero. O resto todo mundo conhece.

O Brasil poderia ter jogado com uma equipe formada por: Barbosa, Djalma Santos e Mauro Ramos de Oliveira (ou Nena); Bauer, Danilo e Nilton Santos; Tesourinha (ou Cláudio Cristóvão do Pinho), Zizinho, Ademir de Menezes, Jair da Rosa Pinto e Simão. Mas perdemos com Barbosa, Augusto e Juvenal; Bauer, Danilo e Bigode; Friaça, Zizinho, Ademir de Menezes, Jair da Rosa Pinto e Chico.

Deixamos de ganhar uma Copa do Mundo em casa, pois tínhamos jogadores para isso, sem falsa modéstia. Não sei se em 2014 teremos uma Seleção a altura para ganharmos uma Copa.

Observando tanta ignorância e vendo a centralização de poder no futebol nas mãos de aventureiros que queriam apenas aparecer com os seus clubes do Rio de Janeiro, àquela época a Capital da República, vendo o desprezo a grandes celeiros de craques como São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e por outros que sequer eram lembrados, por tudo isso é que eu acho que deveríamos ter um julgamento para apurar tanta incompetência.

Naquele tempo ainda estava recente o ”Tribunal de Nuremberg”, que julgara os crimes da Segunda Grande Guerra. Guardadas as devidas proporções, aqui também deveríamos ter tido um julgamento desse tipo para apurar tanta desonestidade, traição a um país que tinha tudo para ser campeão do mundo e não o foi, enchendo uma nação de tristezas.

Muitos jogadores foram culpados da derrota, injustamente. O goleiro Barbosa foi escolhido para receber uma culpa que carregou até sua morte. Uma tremenda injustiça. Os verdadeiros culpados (parte da imprensa, comissão técnica, C.B.D., dirigentes do futebol e políticos) passaram incólumes pelo desastre. Mas esses que fizeram tanto mal ao povo brasileiro, por essa tremenda frustração, já devem estar pagando por isso.

Laércio
Enviado por Laércio em 12/10/2012
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