Estórias, chá e bolinhos de chuva
O dia chegava ao fim. A noite dava seus primeiros sinais. O céu não estava pra estrelas, muito menos pra Lua. Tudo indicava que a chuva não daria trégua. As crianças, contudo, não estavam nem aí com esses detalhes tão insignificantes. Elas esperavam ansiosas, pela chegada do avô, que diariamente sentava-se na cadeira de balanço, para contar causos e estórias dos tempos de sua infância, algumas de arrepiar e todas ressaltando a importância da obediência aos pais, avós, tios, professores. Foi assim por muitos anos.
Na plateia, quietos e de olhos arregalados, os colegas da vizinhança também se deliciavam no passeio pelos mundos da mula sem cabeça, saci pererê, lobisomem, princesas, bruxas e uma infinidade de estórias em que o bem vence o mal. As estórias eram seguidas de muitas perguntas e ao fecho não faltava o célebre “viveram felizes para sempre”. Após esta frase ouvia-se um coro que nunca precisou ser ensaiado: “conta outraaaaaaa” e todas se davam por satisfeitas.
Enquanto as crianças queimavam as últimas energias, na sala, a mãe via os dramas pela TV, o pai cansado do trabalho, dormia estirado no sofá e a avó, na cozinha preparava um chá com bolinhos de chuva, que seriam servidos a todos que ficavam até o final – acordados e sem medo. Era um encontro que se repetia quase diariamente. Dessa forma, a infância seguia rumo à vida adulta, regada pela divina e maravilhosa arte de contar e recontar estórias.