MISERÁVEL
“A política degenerou entre nós em arte maquiavélica,
em instrumento mesquinho das paixões facciosas”
(Rui Barbosa)
Mendigo como sou, vinha passando pela rua catando lixo, até que vem um repórter me abordando e pergunta:
- Em quem você irá votar?
- Pouco importa, pois do jeito que as coisas vão, todo voto dado é um voto ao nada – respondi.
- Por quê? - Me pergunta o repórter.
- Ora... Porque do jeito que as coisas estão, tanto faz você votar em fulano, como em sicrano. Depois do capitalismo, a política não passa de mais uma arte de interesses pessoais.
- Quer dizer que nas idades antiga e média as coisas também não eram assim?
- Sim, eram sim. Mas o rei tinha a ideia que era um DEUS; e o senhor feudal, a ideia que a terra era sua. Foram culturas e modo de vidas diferentes. Muita coisa aconteceu de lá pra cá. Hoje, o empresariado tem a ideia que o político é seu. Tanto a elite, quanto o operariado precisam dos políticos, mas quem tem o capital é o empresário, e, como o homem é o produto mais barato que existe, a troca de favores entre político e empresário é o pau que mais rola nos bastidores da vida. Afinal, político é como mulher gostosa, pra ele te foder só basta uma coisa: querer.
- Mesmo assim ainda não consegui entender porque você diz que tanto faz votar em fulano, como em sicrano.
- É simples. Quando saímos pra votar, vamos com a ideia de votar em doutorzinho isso ou aquilo, mas não sabemos que o voto que damos é um voto que deve ser dado não àquele babaca que aparece a cada dois anos em minha casa prometendo o impossível, mas sim, um voto ao teu vizinho, teu pai, tua mãe e nos vizinhos e pais dos outros.
- Quer dizer que o político não deveria ser eleito?
- Não. O fato é que quando for votar, você deve votar em alguém que eleja o povo, e, como o povo não vota no povo, o político eleito passa a ter uma amnésia até a campanha vindoura. A cultura é outra. A pior de todas: uma cultura da ignorância e da idiotice. Pois acaba que votamos num fulano qualquer que só se preocupará em favorecer o seu curralzinho mequetrefe, quando na verdade, embora se votasse em alguém, votasse pelo pensamento do melhor, não do menos mal. Quando se votasse em alguém, fosse por uma ideologia ou sacrifício, não pela hipocrisia ou benefício. E assim, o cara que fosse eleito, cuidasse tanto de quem votou nele, como naquele que não votou.
- Entendi agora onde você quer bater...
- Isso mesmo: a indiferença é o pior dos sentimentos, pois não há sentimento. Esse é o nosso defeito: quando não reconhecemos o valor do nada, amamos sempre aquilo que não vale nada!
- Mesmo assim explique melhor “o tanto faz votar em fulano, como em sicrano”.
- Bem, assim... não adianta votar com a cabeça ou o sentimento do bem comum, se mil e um ignorantes votam pelo benefício próprio ou pelo direito ao pão de cada dia. As pessoas, para serem independentes, não precisam apenas de ideologia, mas também de grana no bolso. Não adianta pensar com a barriga roncando.
- Acabe essa entrevista com uma frase:
- Como disse o grande Benito Barros, sociólogo e escritor: “vender o voto é se prostituir”. E isto é uma verdade, pois tudo aquilo que vendemos para o prazer alheio é uma forma de fazer a gente uma forma de lixo. Pergunte a qualquer prostituta, por mais dinheiro que ela receba, se ela se sente bem em ir pra cama com um velho barbudo com mau hálito e sovaqueira...?! Pergunta! Como a prostituta, o eleitor reclama, reclama... mas não consegue abandonar a mixaria que vale o seu corpo e a sua alma. Seja por instinto ou necessidade! Alguém um dia disse: “quem se vende recebe sempre mais do que vale”. Para findar de vez, acabo com uma do Henrique Diógenis, poeta potiguar: “dar aquilo que não te pertence, é roubar aquilo que te pertence. O teu voto não é teu; é meu. E vice-versa”.
- Tá bom, tá bom... pedi uma, você me disse três frases. Se fosse candidato acho que votaria em ti (risos).
Pasmo, o repórter acaba a entrevista e sai balançando a cabeça.