Reviver

Conhecemos-nos desde crianças, éramos meios parentes. Adorava sua presença, passávamos as férias juntos, tinha que disputa-la com todos, mas sempre ganhava a peleja. O tempo passou, crescemos um pouco mais e descobrimos nossos corpos, na verdade o dela já havia sido visitado, mas isso não me incomodava, pois ela representava pra mim, uma espécie de mulher ideal, então nada que ela fizesse poderia ser errado ou questionável. A ligação que tínhamos era muito forte, como dois corpos que invariavelmente se atraem, onde eu gravitava em sua orbita na grande maioria das vezes. Nossa relação, apesar de nossa pouca idade, era muito madura, quando estávamos ocupados com outras pessoas não existiam ciúmes, nem indiretas, talvez pelo fato de sabermos tacitamente que era algo passageiro, pois sempre desembocávamos no mesmo rio. Quando estávamos afastados saudade gostosa, quando juntos satisfação. Tudo nela me encantava, a inteligência, o bom gosto musical, principalmente o bom gosto musical, o humor com aquela risada que sendo usada por outra pessoal seria feia, até a sua promiscuidade, promiscuidade não seria a palavra certa, despudor. Até o seu despudor me encantava, por ela muitas vezes quebrei a cara, mas sempre voltávamos pra mesma sala, a mesma conversa boa de amigos que são mais que amigos, éramos crianças maduras.

Hoje muita coisa se passou, muita coisa aconteceu, muitas pessoas aconteceram, passamos de crianças maduras para adultos infantis, hoje são raras as vezes que nos vemos e quando não fingimos que não nos conhecemos, a conversa é uma conversa insólita, sem aquele prazer que sentíamos outrora, a angustia tomou o lugar da satisfação, mas lógico ainda é a menina da minha infância, ainda arquiteto encontros casuais, nos quais adoro ficar no mesmo ambiente que ela, mas evito diálogo, apenas cumprimento e finjo que não estou dando a mínima para sua presença e fico a observa-lá de soslaio, sinto necessidade de vê-la, de estar perto, ao mesmo tempo em que essa proximidade me dói, pois hoje ela não é minha, e a única coisa que me anima é a esperança que sinto, acho que ela também, de que podemos voltar a ser crianças, que podemos desembocar naquele rio que há muito não visitamos, talvez possamos amanhã, hoje não, hoje somos adultos, adultos ridículos.

diniz xavier
Enviado por diniz xavier em 12/10/2012
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