A linguagem dos fogos
Amanhece no país da padroeira. É 12 de outubro e minha fé, guardada na memória afetiva, presenteia-me com uma viagem de volta à pacata cidade onde vivi.
Ouço a primeira súplica no ar. O pessoal da rua de cima. Agora, som de foguetes vindos da direção da escola. Da casa de D. Rosa costureira, da chácara de Seu Jurandir, do asilo, do presídio. Segue o silêncio matutino. Lembro-me de minha família que com certeza estaria por lá incrementando esta manifestação religiosa.
A manhã caminha respeitosa. Em quase todos os pontos da cidade já se ouvem diferentes sons, que juntos fazem brotar lágrimas e emoção.
Meio dia em ponto, a hora do encontro. A fé cobre a cidade inteira com seu manto de amor. A linguagem dos fogos fala mais alto que qualquer tipo de orgulho; a vaidade, o dinheiro, a fama deixam claro seu desvalor. Lançada ao céu está a verdade da vida de cada um, seus fardos, sua esperança.
O passeio termina e volto para onde estou. Em 2020 sou outra, minha fé é outra; ainda assim, fé - talvez até mais forte. Já não peço. Apenas agradeço a força enviada nas horas certas. Hoje as formas de expressão são outras. As demandas são, mais do que nunca, universais. São outras crianças, jovens à procura de um braço forte para seguirem viagem. É por eles que silenciosamente peço.