Por via das dúvidas... 


Isto aconteceu há quase três anos, em uma pequena rua de Bangu. Mas não ganhou mídia. Quer dizer, acho que não ganhou. Se ganhou, na época não vi nada, nem ouvi comentários sobre o assunto. Conto o que me foi contado por uma amiga do peito, nascida e criada naquele velho bairro da Zona Oeste carioca. 

Era noite, e casa de número 37 estava de portas e janelas escancaradas, os vizinhos entrando e saindo numa ansiedade louca, a mãe aos prantos — por volta das quatro da tarde sua filha de doze anos fora achada morta, vítima de estupro, no terreno baldio ali perto. Veio a polícia, fez o que lhe cabia fazer em tais circunstâncias, e se mandou. Veio o relações-públicas do traficante da área, serenou como pôde os ânimos e prometeu vingança, não ia sossegar enquanto não pusesse as mãos nesse calça-frouxa que vinha sujar a boca. Por falar nisso, ninguém tinha visto ninguém de fora rondando o pedaço? No calor da revolta, os vizinhos da pobre mulher descreveram um moço que não era dali mas que tinha cara de tarado: uma sobrancelha assim, um nariz assado, uma barba assustadora. Deixassem com ele, disse o outro. 

Na manhã seguinte, alguns moradores viram quando um garoto de bicicleta, com uma bolsa de plástico dependurada do guidom, apontou na esquina. Vinha parando de casa em casa, batendo palmas no portão. Quando era atendido, abria a bolsa, puxava pelos cabelos uma cabeça recém-cortada e disparava: “O homem mandou perguntar se foi este.”


[24.2.2007]