A máscara
Ela descruza as pernas enfadada. Uma corrente de ar frio perpassa sua costa desnuda no longo decote. Estremece e estranha esse calafrio. Passa calmamente a mão no pescoço e movimenta-se como num alongamento. Deve ser o frio da sua alma que extravasou e inundou o corpo.
Presta atenção á conversa reinante na mesa. As amigas discutem acerca do encanto de um certo recém-chegado. Ela sorri complacente daquilo, relaxa mas não está animada. Se surpreende com uma tigresa, uma borboleta, uma gatinha; é tão incongruente aqueles três animais falando; máscaras, essa á a graça da festa; mas anda tão cansada e só veio por insistência delas. Precisa mesmo passear.
O frio percorre-lhe a costa de novo e ela resolve ir ao banheiro. Pega a bolsa.
Se dá conta do silêncio da mesa porque todos os olhos estão fixos nela, e mais sente do que vê a presença a seu lado. O ar divertido e calado das amigas tira-a de seu mutismo. Então vira lentamente a cabeça. Ele, o ‘ele’ das conversas está ao seu lado.
Ele a convida pra dançar. Ela levanta e parece que está voando. Só a mão dele parece detê-la no chão. Deve ser sua pressão que baixou de novo. Passa a mão na testa e presta atenção á música.
Ele a enlaça e começam a dançar. Ela ajusta a máscara no rosto. Ele comenta sua máscara de mariposa e ela diz que não sobrara outra pra ela e mais não diz. Ela a puxa mais pra si e ela sente um calor percorrer-lhe a costa quando as mãos dele sobem lentamente até suas espáduas.
A sala parece subitamente quente, a música entontece-lhe e todos os sons estão longe.
Vai pedir pra sentar, quando se sente levada para o terraço. A música ficou lá fora e parece que o mundo também. Há um silêncio entre eles e ele toca-lhe o rosto. Não falam e a máscara parece sufoca-la. Como ela não percebeu isso antes? Devem ser as fitas que estão apertadas
Ele permanece calado e ela quer tirar a máscara mas suas mãos não lhe obedecem. Mexe os pés. Olha pra ele, olha pra porta e sem saber como se vê atravessando aquele portal, enquanto ele a chama. A máscara parece ter grudado em seu rosto e ela queria falar-lhe como ela mesma e não essa mariposa verde de listras pretas. Ele está no seu encalço e ela se encaminha rápida pra saída. Ao sair, olha pra trás e ele parece estático. Corre até seu carro e só então vê que a máscara havia caído. Torna a olhar na direção dele e ele está com a máscara na mão. Passa as mãos no rosto nu... em que momento aquela máscara não bem amarrada saiu de seu rosto. Sai em alta velocidade. Precisa dormir. Está com tanto frio.