A Receita Venezuelana
Nessa vitória de Hugo Chávez na Venezuela, com 54,42% dos votos, enquanto o opositor Henrique Capriles obteve 44,97%, “em uma jornada eleitoral histórica com um recorde de participação de 80,94%”, dois fatos são significativos.
Primeiramente a constatação de que “há duas visões no país”, nas palavras de Capriles, ao reconhecer a vitória de Chávez, há 14 anos no poder. Quase que metade da população preferiu o candidato “apoiado pelos principais empresários venezuelanos, banqueiros e meios de comunicação privados”. A outra parte do eleitorado, pouco maior que a metade, representada, dentre outros, por “moradores de casas populares situadas nos morros de Caracas”, parece que não se cansou ainda do atual Presidente. Que é apresentado no exterior pela propaganda internacional como um ditador, com visíveis intenções de se perpetuar no poder.
A eleição de Chávez mostrou que não é bem isso o que acontece, tendo em vista que ele ganhou por pouco. E que o processo democrático tornou-se vitorioso. Com o maior conjunto dos venezuelanos, possivelmente representado pelas massas populares, colocando-se ao lado do atual Presidente. Se houvesse uma ditadura chavista, as coisas não caminhariam desse jeito. E os setores mais elitizados não teriam garantido o espaço que lhes foi concedido pelos votos obtidos. Contudo, ao que tudo indica, a parte do povo menos favorecida venceu.
O outro fato significativo refere-se ao sistema eleitoral venezuelano. Embora o voto não seja obrigatório, como em nosso país, a participação de 80,94% dos votantes é considerada histórica. Numa demonstração de que, quando as pessoas entendem que é importante a sua manifestação, não é preciso que ninguém as obrigue a isso.
Essa participação intensa do conjunto de eleitores acaba incidindo diretamente na sua politização. Ao contrário do que pensam os que, no Brasil, se posicionam a favor da obrigatoriedade do voto. Quando a maioria dos venezuelanos, encontrada entre os mais necessitados, entendeu que devia conter o avanço dos setores mais elitizados, ela compareceu às urnas. A despeito de todo o dinheiro que deve ter sido gasto para que isto não acontecesse.
Em nosso país ninguém fala em voto facultativo. E por isso, tendo-se como agravante as infindáveis notícias de corrupção, de compra de votos, de desvio de dinheiro público, etc., não chega a ser absurdo imaginarmos que as pessoas, de um modo geral, se sintam desmotivadas a votar. Primeiro porque votam por obrigação. E depois porque acabam se despolitizando, num cenário em que já é comum não se acreditar em políticos.
Rio, 08/10/2012