Crescer é se despedir
"Quem estaria certo e quem estaria errado? Agora eu sou adulto e continuo sem saber. Mas em algum momento, tarde da noite, quase ao adormecer, as idéias e desentendimentos se dissipam e restam apenas as pessoas. E as pessoas naquele tempo não eram diferente do que sempre foram e sempre serão. As moças se apaixonam. Os homens e as mulheres sofrem sozinhos pelas escolhas que fizeram. E os meninos, confusos, cheios de medo, de amor e de coragem crescem silenciosamente enquanto dormem."
(Do seriado "ANOS INCRÍVEIS)
A vida é cheia de despedidas. Nos despedimos de quem fomos, de quem amamos, da casa onde moramos, do quintal onde brincamos, da rua onde conhecemos o 1o. amor.
Despedimos de brincadeiras, rostos, lugares, paisagens.
Crescer é deixar partir, como no dia em que o carro de meus pais se afastou, deixando a menina desamparada que aos 17 só imaginava ser novo o 1o. dia na faculdade, numa cidade distante. Naquele dia eu não sabia, mas me despedia principalmente da infância, da casa onde nasci, da vida que tivera até ali. Mesmo que estivesse de volta no próximo fim de semana, nunca mais voltaria definitivamente.
Crescer impõe dizer adeus. E essa é uma palavra difícil porque ficar é muito mais fácil.
Deixar para trás, envelhecer, tomar novos rumos, evoluir, morrer... tudo isso faz parte da vida mas nem por isso é menos dolorido.
Rindo ou chorando descobrimos que existe beleza na dor, na saudade, naquilo que vivemos e não existe mais, nas pessoas que se foram mas ainda vivem dentro de nós, nos lugares que visitamos, nas paredes que foram testemunhas de nossas lutas, dores, amores, dúvidas, mudanças, arrependimentos, amadurecimento.
Por isso gosto tanto do seriado "ANOS INCRÍVEIS". Por meio da narrativa de Kevin Arnold adulto somos levados a relembrar nosso próprio crescimento através dos olhos do menino: os conflitos, descobertas, tristezas e decepções não só da juventude, mas de toda a vida.
Anos incríveis fala da família nos anos 60 e 70 num subúrbio dos EUA e mostra a beleza da vida que por muitas vezes sozinhos não conseguimos enxergar. A partir dos 13 anos Kevin se depara com a morte, a despedida da infância, o 1o. amor, o mundo adulto difícil e cheio de conflitos, as aventuras, o crescimento, o adeus.
Reproduzo aqui algumas passagens da "sabedoria"de Kevin que nos leva a compreender nossa própria orfandade diante da vida e da morte:
Sobre o tempo:
"Nós temos pressa, mas é preciso aprender que ás vezes o tempo corta nosso peito como faca e deixa a marca pra sempre."
“Ás vezes as crianças são homens, mas, ás vezes os homens são crianças, talvez seja essa a confusão! Tudo que eu sei, é que o mundo ficou muito grande de repente e eu, me senti muito pequeno”
Sobre o amor:
"Por toda a nossa vida, procuramos por alguém pra amar... alguém que nos complete... nós escolhemos companhias e mudamos de companhias... dançamos músicas que falam de corações partidos e de esperança... e por todo o tempo pensando se, em algum lugar, de alguma forma, existe alguém perfeito, que esteja à nossa procura..."
"O amor nos obriga a fazer coisas engraçadas. Ele nos torna orgulhosos, ele nos deixa arrependidos(...). E mesmo que eu não soubesse que caminho seguiríamos, sabia que não podia deixar que ela saisse da minha vida."
Sobre seu pai:
"E ele sempre estaria lá, um parceiro silencioso. Foi o primeiro a me receber quando me formei no colégio e foi o último a sair quando fui para a faculdade. Minha mãe me contou que ele ficou horas na rua após eu me despedir".
Sobre os amigos e pessoas importantes:
"Algumas pessoas passam por sua vida e você nunca mais pensa nelas. De outras, você se lembra e talvez imagine o que pode ter acontecido com elas. Outras, você imagina se pensam no que aconteceu a você. E há aquelas que você não gostaria nunca mais de lembrar, mas se lembra."
No último episódio, Kevin se despede assim:
"Crescer acontece muito depressa. Um dia, você está de fraldas e no outro já está indo embora. Mas as lembranças da infância permanecem com você durante muito tempo. Me lembro de um lugar... uma cidade... uma casa... Como todas as outras casas....Um jardim, como todos os outros.... numa rua, como todas as outras. E... depois de todos esses anos, eu continuo a me lembrar... com admiração."
Tudo isso me fez lembrar do filme "Toy Story 3", em que os adultos saíam do cinema enxugando as lágrimas._não somente pela constatação de que os filhos crescem e nos sentimos como brinquedos sem utilidade colocados no sótão_ mas também pela percepção da efemeridade de nossas próprias vidas, muito mais do que desejaríamos que fosse.