As mensagens que nos expõem
(Flavia Costa)

O meu celular vibrou anunciando a chegada de mais uma mensagem. Eu poderia imaginar qualquer coisa, um recadinho de algum conhecido, alguma promoção de apartamentos (tenho recebido muitas, e olha que nem estou pensando em me mudar), mensagens promocionais ou “gastacionais” da minha operadora e mais uma infinidade de possibilidades. Mas eu, uma simples brasileira, acabo de ser convidada, via SMS, pela presidenta e pelo candidato a quem ela apoia aqui na cidade para um comício perto da minha casa.

Agora, vem cá, tudo bem ser convidado para um comício, que acontecerá perto de sua casa, por meio de carros de som, propaganda eleitoral no rádio ou TV ou panfletinhos que poluem as ruas. Mas por telefone, e ainda celular?

Espera aí que estou assustada. Vou correndo fechar as janelas deve ter alguém me vigiando.

Eu não conheço a presidenta e nem o candidato citado, a única afinidade que temos é o fato de sermos mineiros, não tenho envolvimento com partidos políticos e cabos eleitorais, então:

- Como eles sabem o meu telefone e, mais, como sabem que eu moro próximo ao local do comício?

Certamente pegaram em uma lista destas que correm soltas por aí, ou então, sem que soubesse eu mesma acabei revelando meus dados ultra, mega secretos. Mas independente da forma que me descobriram ainda estou apavorada, por precaução as janelas continuarão fechadas e as portas trancadas.

Agora sim chego ao cerne da questão (tô falando bonito porque o assunto é sério), de que adianta portas trancadas, janelas fechadas, se hoje nesse mundo tão comunicacional, mais do ponto de vista da quantidade e difusão nem tanto da qualidade ou da comunicação dialógica frente a frente, acabamos nos expondo mais do que é necessário e conveniente. Sem que percebamos, alguns percebem e fazem intencionalmente, nós mesmos possibilitamos aos vigias e fofoqueiros de plantão acumular informações e dados que nos denunciam seja contra, a favor ou simplesmente para sermos convidados para um comício.

A internet e suas redes sociais, os celulares e suas câmeras indiscretas, a TV e seus realities shows, as empresas que vendem dados cadastrais e tantos outros são as janelas escancaradas e as portas sem chave que nos impedem de manter muitas de nossas informações confidenciais.

Essa é Aldeia Global na qual vivemos, em que os meios de comunicação e a tecnologia são não apenas o princípio, mas também o fim de todas as coisas. A comunicação torna tudo tão próximo e tão distante, estamos tão perto, estamos tão longe. Todo o mundo sabe quem somos, mas poucos nos conhecem. Resumindo: nossa vida é um paradoxo.

É tão paradoxal que eu estou expondo algo, para pessoas que não conheço, e que poderia ter ficado apenas entre mim, meu celular, a presidenta e o candidato mencionado. Você que está me lendo agora nunca me viu na vida e, certamente, nunca verá. Não me conhece, mas sabe que eu tenho celular (não sou nenhuma exceção) e recebo as mais diversas mensagens por meio dele, sabe também que não estou pretendendo me mudar e que, possivelmente, desenvolverei algum distúrbio relacionado à mania de perseguição. Mas e daí, o que isso muda em sua vida, nada. Mas certamente, para vigias comerciais ou eleitorais, fofoqueiros e psiquiatras de plantão e tantos outros, essas informações são preciosíssimas, e por conta delas posso ser contatada para diversas finalidades e por múltiplos meios. E sem direito a reclamação, afinal, decidi me expor.

E como acho que já me expus demais, não vou dizer aqui se irei ou não ao comício, sei lá quem pode estar lendo essa coisa toda que resolvi compartilhar (palavrinha da moda). Ainda mais que o final da mensagem é no mínimo estranho, diz assim: Envie SAIR p/ ser removido. Eu não sei se quero ir ao comício, mas tenho certeza que não quero ser removida, seja lá de onde for. Então, talvez eu faça um teste. Quem sabe, se eu não enviar nenhuma resposta para SAIR e não for ao comício, recebo depois uma mensagem da presidenta e do candidato citado lamentando a minha ausência. Afinal, como eu disse anteriormente, nunca sabemos quem está nos vigiando e quais serão as consequências de nossa exposição.





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